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Domingo, Dezembro 22, 2024

Pequim meteu a pata no drone

José Mateus
José Mateus
Analista e conferencista de Geo-estratégia e Inteligência Económica

Até Putin tem motivos para agradecer o serviço prestado. Mas, para Pequim, foi uma “bazookada” nos pés. Ou Xi Jiping fez mal as contas ou alguém o enganou muito. Como diria o clássico, o roubo do drone naval americano foi pior que um crime, foi um erro.

Misto da tradicional cultura chinesa de embuste e estratagema e de uma gritante ingenuidade nas relações internacionais (típica de um Estado que durante longas décadas esteve fechado ao mundo e, portanto, o conhece muito mal), a política externa de Pequim tem, frequentemente, momentos que seriam para rir, não fossem as trágicas consequências a que abrem a porta.

O roubo (ou captura, depende do ponto de vista adoptado), em águas internacionais, de um drone naval americano pelos militares chineses é um verdadeiro presente feito aos Estados Unidos (e, sobretudo, a Trump) mas, para Obama, é um presente envenenado.

Ninguém irá esquecer o atrevimento deste gesto totalmente inamistoso que Xi Jiping endereça a Obama nos dias finais do seu mandato. Para ousar este atrevimento, Pequim tem de considerar que a Casa Branca não tem qualquer capacidade de retaliação imediata, que Obama é um presidente sem capacidade de resposta… Em suma, um imenso insulto pessoal feito a Obama.

Para aqueles que nos Estados Unidos têm defendido que o “inimigo principal” (para usar uma categoria omnipresente no “Da Guerra Prolongada” de Mao Tsé Tung) é não a Rússia mas a China, este “apiratado” atrevimento de Pequim é ouro sobre azul.

Depois da polémica levantada pelo telefonema de Trump com a presidente de Taiwan e das declarações do presidente eleito sobre a China, o roubo do drone naval veio lançar uma nova luz sobre a realidade das relações entre Pequim e Washington. Trump agradece…

O momento escolhido por Pequim para este assalto de autêntica pirataria de Estado é também um autêntico mimo. Quando a CIA e outras agências americanas de “intelligence” estão monopolizadas para a manobra de política interna sobre a interferência russa, por meios digitais, na campanha presidencial americana, um elefante chinês entra na loja e rebenta com a porcelana toda…  Oferecendo assim uma bela manobra de diversão. Vladimir Putin, naturalmente, agradece. Aliás, a coisa cai tão bem que, às tantas, ainda vai por aí aparecer quem diga que foi o maquiavélico czar de todas as Rússias a telecomandar a pirataria chinesa!

A forma como Pequim quer agora encerrar o episódio (prometendo devolver o drone… depois de, claro, o ter “espiolhado” e copiado) é também muito clarificadora da forma de raciocinar e agir dos chineses e deixa a percepção de que o primeiro grande erro estratégico nas relações com a China é… confiar neles, mesmo um nano-milímetro que seja! Como pirataria desqualificante e descredibilizadora é difícil inventar melhor.

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