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Sábado, Novembro 2, 2024

Pobreza aumenta entre os trabalhadores

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

O peso da pobreza em Portugal aumentou em 2018 nos trabalhadores empregados e nos desempregados e continua a ser elevado em todas as outras camadas da população. E os aumentos de miséria nas pensões em 2020

Neste estudo analiso não só alguns aspetos importantes dos dados divulgados recentemente pelo INE referentes à pobreza em Portugal, que tinham sido omitidos pela generalidade dos órgãos de comunicação (o aumento significativo da pobreza na população empregada e desempregada).

Assim como, com base no aumento de preços (IPC) referente a Novembro de 2019 e nas normas do Decreto-Lei 53-B/2006 consolidado, calculo o previsível aumento de miséria das pensões quer da Segurança Social quer da CGA em 2020:

  • pensões até 877,97€ terão aumentos de 0,74%;
  • pensões de valor superior a 877,97€ até 2.633,9€ os aumentos serão apenas de 0,24%;
  • pensões de valor superior a 2.633,9€ os aumento serão de 0%, ficam congeladas).

Utilizando o valor da esperança de vida aos 65 anos referente a 2019, divulgado pelo INE, calculo o fator de sustentabilidade para 2020 concluindo que, entre 2019 e 2020, ele deverá aumentar de 14,67% para 15,2%.

Portanto, os trabalhadores que pedirem a reforma ou a aposentação antecipada em 2020, incluindo ao abrigo do regime após desemprego de longa duração, se aos 60 anos não tiverem pelo 40 anos de descontos, sofrerão um corte previsível na sua pensão de 15,2% devido à aplicação do fator de sustentabilidade. A este corte há que adicionar o corte de 0,5% por cada mês que falte ao trabalhador para atingir a idade de 66 anos e 5 meses.

Portanto, serão duplamente penalizados, se aos 60 anos não tiverem pelo menos 40 anos de descontos, uma situação injusta que o anterior ministro do Trabalho, Vieira da Silva, tinha prometido corrigir mas cuja palavra não cumpriu. É urgente acabar com esta dupla penalização, eliminando o fator de sustentabilidade para todos os trabalhadores.

Espero que o estudo possa ser útil aos trabalhadores portugueses já que a recuperação de rendimentos obtida na ultima legislatura foi claramente insuficiente como mais uma vez prova este estudo em que utilizo apenas dados oficiais.

 


Estudo

O peso da pobreza em Portugal aumentou em 2018 nos trabalhadores empregados e nos desempregados e continua a ser elevado em todas as outras camadas da população. E os aumentos de miséria nas pensões em 2020

 O INE publicou em 26 de Novembro deste ano, os resultados do “Inquérito às Condições de Vida e de Rendimento, realizado em 2019 sobre rendimentos do ano anterior” que inclui um quadro importante com dados que foram omitidos pela comunicação social que mostra a evolução do risco de pobreza nos diferentes estratos da população em Portugal (quadro 1).

Quadro 1 – Taxa de risco de pobreza após transferências sociais, segundo a condição perante o trabalho e sexo, Portugal, 2015-2018

Ano de referência 2015 2016 2017 2018
Empregado – em % 10,9 10,8 9,7 10,8
Homens – em % 11,3 11,2 10,4 11,0
Mulheres – em % 10,5 10,4 9,0 10,6
Sem emprego – em % 25,4 25,1 24,8 24,2
Homens – em % 24,5 24,6 23,5 23,6
Mulheres – em % 26,1 25,5 25,8 24,7
Desempregado – em % 42,0 44,8 45,7 47,5
Homens – em % 44,5 47,1 47,4 52,9
Mulheres – em % 39,4 42,5 44,1 42,7
Reformado – em % 16,0 15,1 15,7 15,2
Homens – em % 15,6 14,5 14,3 14,7
Mulheres – em % 16,3 15,6 16,9 15,6
Outros inativos – em % 31,2 32,3 30,8 31,0
Homens – em % 26,0 32,1 29,9 28,7
Mulheres – em % 33,5 32,4 31,2 32,0
FONTE: INE, EU-SILC: Inquérito às Condições de Vida e Rendimento – 2016-2019

Contrariamente ao que se podia pensar, os dados publicados pelo INE revelam que, em 2018, não se verificou uma diminuição mesmo diminuta da pobreza em Portugal (de 17,3% para 17,2%) em todos os segmentos da população.

Pelo contrário, registou-se mesmo um aumento do peso da pobreza quer na população empregada (10,8% da população empregada em 2018, quando em 2017 era de 9,7%) consequência dos baixos salários pagos pelos patrões, quer no grupo de “desempregados” cuja taxa de risco de pobreza tem aumentado de uma forma permanente desde 2015 e também entre 2017  em 2018 (42% do total de desempregados em 2015, 47,5% em 2018).

O aumento da pobreza no grupo de desempregados é uma consequência da redução drástica do número de desempregados a receber subsídio de desemprego como mostra o gráfico 1 construído com dados divulgados pela Segurança Social e pelo INE.

 

Gráfico 1 – Desemprego Total e desempregados a receber subsidio de desemprego

FONTE: INE e Segurança Socal

Entre 2015 e Setembro de 2019, o numero de desempregados a receber subsidio de desemprego diminuiu de 285.780  para apenas 167.889 (- 41,2%).

Esta quebra drástica no número de desempregados a receber subsidio de desemprego determinou que a taxa de cobertura do subsidio de desemprego em Setembro de 2019 fosse apenas de 33,4%.

Isto significa que, em Setembro de 2019, por cada 100 desempregados apenas 33 recebiam subsidio de desemprego. Os restantes tinham de “desenrascar” ou recorrendo ao apoio de familiares ou amigos, a “biscates” ou então transformando-se nos “sem abrigo” que povoam as cidades.

 

Em 2018, 5,100.000 portugueses tinham um rendimento mensal ilíquido (antes de descontos e impostos) inferior a 716€, e 1.767.000 inferior a 430€/mês (14 meses)

De acordo com o INE, o limiar de pobreza era, em 2018, apenas 430€/mês (14 meses), e o número de habitantes em Portugal que tinham naquele ano um rendimento mensal inferior àquele valor correspondia a 17,3% da população total, ou seja, a 1.767.000 habitantes. Portanto, todos aqueles que tinham um rendimento mensal superior àquele valor (por ex. 431€/mês) já não eram considerados nas estatísticas oficiais como pobres.

Por outro lado, o limiar da pobreza corresponde a 60% da mediana, portanto rapidamente se conclui que metade dos habitantes de Portugal em 2018 – 5.138.309 – tinham um rendimento mensal bruto para viver inferior a 716€/mês. Depois de descontos e impostos fica muito pouco

 

Os aumentos de miséria nas pensões em 2020 previstos com base na lei em vigor

Segundo o Decreto-Lei 53-B/2006, as pensões da Segurança Social e também da CGA são atualizadas anualmente com base num índice que é calculado da seguinte forma:

  1. Se a média do crescimento real do PIB nos dois anos anteriores  for igual ou superior a 2% e inferior a 3%, a atualização das pensões de valor igual ou menor a 2IAS corresponde ao aumento do Índice de Preços no Consumidor acrescido de 20% da taxa de crescimento real do PIB, com o limite mínimo de 0,5 pontos percentuais acima do valor do IPC;
  2. Se a média do crescimento real do PIB for inferior a 2%, o aumento das pensões até 2 IAS corresponde ao aumento do IPC . Isto em relação às pensões até 2IAS que, em 2020, deverá corresponder ao valor de 877,97€, portanto em relação às pensões mais baixas (dá um aumento de 0,9% no caso do PIB em 2019 crescer 1,9%, e 0,4% se o crescimento real do PIB for em 2019 inferior a 1,9%).

O quadro seguinte dá uma informação clara dos previsíveis aumentos de miséria das pensões em 2020, supondo que o PIB cresce 1,9% em 2019 (a confirmar no fim do ano).

Quadro 2 – O aumento previsível das pensões da Segurança Social e da CGA em 2020

Valor Mensal das Pensões Aumento % das pensões da Segurança Social e da CGA em 2020 se o PIB em 2019 crescer 1,9% Aumento das pensões da Segurança Social e da CGA em euros se o PIB em 2019 crescer 1,9%
Pensões de valor igual ou inferior a 877,97€ 0,74% Aumentos entre 1,56€ (pensões mínimas) e 6,50€
Pensões de valor superior a 877,97€ até 2.633,91€ o,24% Aumentos entre 2,12€ e 6,32€
Pensões de valor superior a 2.633,91€ 0,0% 0€

 

Na melhor das hipóteses (aumento do PIB de 1,9% em 2019), o aumento das pensões da Segurança Social e da CGA em 2020 variarão entre 0,24% e 0,74%, portanto inferior a 1%. São aumentos de miséria. Em euros, para as pensões mais baixas, variam entre 1,56€ (pensões mínimas) e 6,5€.

 

Em 2020, a idade de acesso normal à reforma ou aposentação continuará a ser 66 anos e 5 meses, mas o fator de sustentabilidade aumenta de 14,67% para 15,2%

Contrariamente ao que divulgaram alguns órgãos de informação (ex. SIC) a idade de acesso à reforma ou aposentação em 2020 é a mesma de 2019 (66 anos e 5 meses) por força da Portaria 50/2019, que no seu artº 1º dispõe que “A idade normal de acesso à pensão de velhice do regime geral de segurança social em 2020, ….., é 66 anos e 5 meses”.

Utilizando a esperança de vida aos 65 anos em 2019 divulgada pelo INE, o fator de sustentabilidade deverá aumentar, entre 2019 e 2020, de 14,67% para 15,2%. Portanto, todos os trabalhadores que peçam a reforma ou aposentação antecipada em 2020, e que aos 60 anos não tenham pelo menos 40 de descontos, sofrem duas penalizações:

  1. um 1º corte na pensão de 0,5% por cada mês que lhe falte para os 66 anos e 5 meses;
  2. E um 2º corte de 15,2% que resulta da aplicação do fator de sustentabilidade. Só não sofrem este 2º corte, os trabalhadores que aos 60 anos de idade tenham pelo menos 40 anos completos de descontos.

Este corte de 15,2% que resulta do fator de sustentabilidade, também se aplicará em 2020 às pensões pedidas ao abrigo do regime de reforma antecipada após desemprego de longa duração. No entanto, aqui o corte de 0,5% por mês em falta é calculado não em relação a 66 anos e 5 meses mas sim relativamente a 62 anos).



 

 


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