A poluição no rio Almonda, já ultrapassou todos os limites e violou todas as leis em vigor no país, acabando por se transformar numa derrota para todos os grupos ambientalistas em Portugal, nomeadamente a Quercus.
Há mais de três décadas que se fazem descargas ilegais de esgotos e efluentes industriais sem tratamento no rio Almonda. No Verão, o cheiro que tresanda nas margens do rio é horrível. E mesmo sabendo que as águas estão contaminadas, existem muitas pessoas que não têm outra alternativa senão utilizar as mesmas na rega das suas plantações agrícolas. Ou seja, para além de um crime ambiental que já tem “barbas”, a poluição do rio Almonda também poderá afectar a saúde das pessoas que vivem perto das suas margens.
O Ministério do Ambiente já prometeu identificar os prevaricadores e aplicar-lhes coimas. Mas até ao momento, ainda ninguém foi punido por este crime ambiental.
E sempre que existem eleições autárquicas ou legislativas, lá aparecem os políticos a utilizar a poluição do rio Almonda como bandeira eleitoral. Prometem alertar as entidades competentes para este problema ambiental gravíssimo, mas chegados ao poder nada fazem. Cai tudo no esquecimento.
Na primeira quinzena de Julho deste ano, António Gomes, deputado do Bloco de Esquerda (BE) na Assembleia Municipal de Torres Novas alertava para o seguinte: “O problema da poluição do rio Almonda é caso de saúde pública. A degradação ambiental do rio tem vindo a agravar-se nos últimos meses e é preciso alertar as populações e as entidades competentes”.
E o que foi feito? Nada. Quantos poluidores foram identificados e punidos? Nenhum. A maioria das fábricas que fazem descargas ilegalmente para o leito do rio Almonda, em vez de fazerem o pré-tratamento das suas águas residuais, optam por efectuar descargas ilegais no Almonda pela calada da noite.
Ou seja, estamos perante um crime ambiental que continua impune. O que não deixa de ser vergonhoso. Sabe-se que foram investidos 10 milhões de euros na requalificação das estações de tratamento de águas residuais (ETAR’s) no concelho de Torres Novas, mas a verdade é que a poluição se tem agravado. E com a chegada das primeiras chuvas de Outono, as descargas ilegais prosseguem.
O rio Almonda que nos tempos dos nossos avós era considerado uma pérola ambiental do concelho de Torres Novas, foi praticamente assassinado. A sua água cristalina ideal para banhos de Verão e lugar de pescarias, transformou-se num esgoto a céu aberto e um lugar maquiavélico em termos ambientais. A cor da água é esverdeada (e nalguns casos avermelhada escura e oleosa), o cheiro é nauseabundo e olhando para o seu leito, deparamo-nos apenas com uma lama escura. Horrível.
Aquele que foi um dos corredores ecológicos mais lindos do distrito de Santarém, está transformado num lamaçal fedorento e de água envenenada. Uma água que não permite o desenvolvimento de flora e muito menos de peixes. Aliás, basta desfolhar a imprensa regional dos últimos trinta anos para percebermos efectivamente o que se passa no rio Almonda.
Quem conhece o rio Almonda, sabe que até aos anos 70, as ribeiras que levavam as águas de Inverno para o rio ficavam secas no Verão. Mas há mais de trinta anos que essas ribeiras são utilizadas para efectuar descargas industriais ilegais e estão sempre activas durante o Verão.
É público que houve um grupo de cidadãos voluntários que criou uma lista das empresas que têm vindo a efectuar descargas no rio Almonda. As entidades competentes sabem disso, mas segundo o presidente da Câmara Municipal de Torres Novas, Pedro Ferreira, “há alguns anos que as entidades que tutelam o ambiente em Portugal têm conhecimento desta situação, mas a verdade é que têm permitido abusos sem punir os prevaricadores”.
A Agência Portuguesa do Ambiente (APA), o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), o Serviço de Protecção da Natureza (SEPNA) da Guarda Nacional Republicana (GNR) e os responsáveis pelas Águas do Ribatejo, prometeram este Verão, procurar soluções ambientais para acabar com a poluição do rio Almonda e punir todos os empresários que façam descargas ilegais, mas a verdade é que as populações locais já não acreditam em milagres.
No primeiro semestre deste ano, o SEPNA avançou com quatro autos de notícia no concelho de Torres Novas, por contra-ordenação ambiental muito grave, relativo a uma descarga no meio hídrico de resíduos de óleos alimentares, transportados num camião cisterna. Mas pelo que pudemos apurar ainda não houve punição efectiva.
O socialista Rui Medinas, presidente da Câmara Municipal da Golegã diz que “é preciso apostar forte na fiscalização das empresas industriais que se fixam na região, no próprio licenciamento industrial e na eventual retirada licença de funcionamento, se houver assinalamento de prática reiterada de crimes ambientais”.
A Câmara Municipal da Golegã está a fazer um investimento de um milhão de euros na margem ribeirinha da freguesia da Azinhaga. O objectivo será garantir um Almonda mais limpo e despoluído, mas se não houver uma intervenção por parte das autoridades competentes e no terreno, este dinheiro público poderá ser desperdiçado.
O rio Almonda nasce na serra de Mira D’Aire, atravessa a fronteira dos concelhos de Torres Novas e da Golegã na zona do Paul do Boquilobo, a primeira reserva natural em Portugal que foi classificada pela UNESCO como um exemplo ambiental único e uma reserva da Biosfera, em 1981.
Mas se a poluição do rio Almonda continuar impune, é natural que esta reserva venha a ser afectada, uma vez que a água que chega a esta área ecológica protegida é oleosa, esverdeada e pestilenta.
E esta preocupação pelos vistos já chegou aos responsáveis da Quercus. Há uns dias atrás, João Branco, presidente desta organização ecologista, reconheceu publicamente que “temos falta de meios para penalizar os poluidores dos rios em Portugal”. Eis a realidade do Ambiente no nosso país.
Tudo leva a crer que a poluição dos rios em Portugal vai continuar (inclusive o rio Almonda). E se assim for, isso provocará a diminuição da biodiversidade e afectará toda a cadeia alimentar nacional.