Será que os dirigentes da U.E. aprenderão alguma coisa com o que se está a passar nos EUA ou continuarão cegos na sua arrogância que “a Europa é um jardim e a maior parte do mundo uma selva” como afirmou Josep Borell em out.2022?
Neste estudo analiso, utilizando a linguagem fria mas objetiva dos dados económicos e sociais dos EUA (PIB, taxas de juro do crédito, salário medio, inflação, poder de compra, desemprego, repartição do rendimento, despesas de biliões de dólares com duas guerras -Ucrânia e Israel – negligenciando, segundo muitos americanos, as necessidades internas da população) a presidência de Trump e de Biden, mostrando que estas são as razões profundas que levaram a divisão praticamente ao meio do eleitorado americano e que podem permitir que Trump ganhe as eleições, e não apenas razões ideológicas, propagando ou “fake news”, como a maioria de jornalistas e comentadores que dominam os media, nomeadamente TVs, pretendem fazer crer.
Estudo
Porque razão Trump pode ganhar as Eleições no EUA: Será que os dirigentes da U.E. aprenderão alguma coisa com o que se está a passar nos EUA ou continuarão cegos na sua arrogância que “a Europa é um jardim e a maior parte do mundo uma selva” como afirmou Josep Borell em out.2022?
A matéria que vou abordar neste estudo é sensível e eventualmente vai contra a corrente dominante (ou pensamento único dominante) criada pela repetição, sem qualquer contraditório, dos comentadores e mesmo jornalistas que dominam atualmente os órgãos de comunicação social no nosso país, nomeadamente televisões. No entanto, embora correndo o risco de não agradar a todos, penso que é necessário ter a coragem para a abordar esta matéria, por mais incómoda que ela seja para muitos, já que pode ser um contributo, embora pequeno, para que não aconteça o mesmo na Europa que se está a verificar nos EUA, ou seja, é o nosso para uma reflexão mais objetiva e fundamentada da realidade atual dos EUA onde o eleitorado está praticamente dividido ao meio de uma forma inconciliável, e onde o dialogo entre membros das duas partes parece impossível, afetando as próprias famílias, e até os casamentos como já li (para muitos americanos o casamento entre um(a) republicano(a) e um(a) democrata é impensável).
UMA REALIDADE QUE SURPREENDE MUITA GENTE NA EUROPA QUE CONTINUA SURDA E CEGA A ELA
Em entrevistas a eleitores americanos tenho ouvido as razões por que muitos dizem que vão votar em Trump, o que é uma surpresa para muita gente na Europa. Um deles resumiu as suas razões assim: “Com Trump tinha dinheiro no meu bolso e agora não tenho”. E isto já para não referir a questão dos imigrantes que muitos americanos pensam que lhes estão a tirar os empregos, as casas (há também grande falta de habitação nos EUA), isto para não falar das acusações inqualificáveis e desumanas que Trump utiliza para justificar a deportação maciça de imigrantes que promete fazer se for presidente Ao ouvir as justificações de eleitores americanos lembrei-me da afirmação de Clinton de que a “é a economia, estúpido”, pois é ela que determina o sentido de voto de muitos americanos (não apenas nos EUA, também na Europa) pensei que seria útil reunir um conjunto de dados sobre a situação da economia e da sociedade americana durante a presidência de Trump e de Biden, que constam dos quadros deste estudo , e que são apenas contributos para uma melhor compreensão do que está a acontecer nos EUA, para a reflexão e para que cada um tire as suas próprias conclusões.
E isto porque a maioria dos chamados “especialistas” escolhidos por critérios ideológicos e não de conhecimento que enchem as televisões no nosso país revelam incapacidade para analisar as razões profundas que motivam que dezenas de milhões de americanos apoiem Trump, apresentando o confronto entre Kamala e Trump como fosse um confronto apenas entre duas pessoas, uma espécie de combate de box “entre o bem e o mal”, quando esse confronto é entre dezenas de milhões de pessoas divididas não só por razões ideológicas, pela propaganda e por “fake news”, como pretendem fazer crer, mas também por razões materiais profundas, por condições de vida muito diferentes, por desigualdades sociais enormes na repartição da riqueza e do rendimento nos EUA. Mas tudo isto é sistematicamente ignorado nas análises desses “especialistas”, que dizem sempre mais do mesmo por razões ideológicas (até parece queforam formatados) e sem contraditório, procurando assim criar “um pensamento único”, e quem se atreva a pensar diferente é logo acusado de defender o “inimigo”. Repito, o que se pretende com estudo é apenas fornecer aos leitores dados objetivos para que cada um possa refletir de uma forma fundamentada e tirar as suas próprias conclusões.
O CRESCIMENTO ECONÓMICO, AS TAXAS DE JURO DO CRÉDITO, O AUMENTO DOS SALÁRIOS MÉDIOS E DA INFLAÇÃO, A VARIAÇÃO DO PODER DE COMPRA DOS TRABALHADORES, E A TAXA DESEMPREGO NOS EUA DURANTE TRUMP E BIDEN
Para se poder compreender a enorme divisão e mesmo antagonismo que se verifica na sociedade americana atual , que pode levar à eleição como presidente dos EUA pessoas com o perfil de Trump, mais importante que visões ideológicas que cada um tem da sociedade, é conhecer como evoluiu concretamente a economia dos EUA e as condições de vida dos americanos nos últimos anos e, nomeadamente durante as presidências de Trump e Biden. Observe-se o quadro seguinte.
Quadro 1 – Crescimento económico, taxas de juro, remuneração média, inflação e taxa de desemprego EUA entre 2017/2024
A nível de crescimento económico (PIB), numa primeira análise parece que a economia americana cresceu mais com Biden (+11,4) do que com Trump (+4,8%) . Mas esta diferença é aparente porque, em grande parte, é determinada pelos anos da pandemia (em 2020: -3,4%; em 2021:+5,7%) como sucedeu em todo o mundo. Se retiramos esses 2 anos anormais (2020 e 2021) , a taxa de crescimento da economia dos EUA foi de 7,8% durante os anos de Trump (2017, 2028 e 2019) e de 6% durante os de Biden (2022, 2023 e 2024). A remuneração média, aumentou 10,2% durante a presidência de Trump e 17,2% com Biden, mas como inflação subiu 7,7% com Trump e 21,4% com Biden, o poder de compra dos trabalhadores americanos aumentou em +2,3% com Trump, e com Biden diminuiu em -3,3% ( se retiramos os dois anos da pandemia a redução do poder de compra é de -1,3% com Trump e de -8,2% com Biden). A juntar a isto as taxas do juro do crédito aumentaram muito mais com Biden do que com Trump (3,9% e 5,3%, ver quadro1) e como os americanos vivem muito do crédito, isso contribuiu para agravar ainda mais a sua vida. A média das taxas anuais de desemprego foi de 5% com Trump e 4% com Biden ( se retirar os 2 anos da pandemia passam para 4% e 3,6%). Não se pode dizer que a presidência de Biden foi melhor para os trabalhadores do que a de Trump. Em relação a preços (inflação), salários, e taxas de juro, importantes para os trabalhadores pois têm consequências diretas e imediatas nas condições de vida, os dados mostram que a presidência de Biden foi pior do que com Trump. E Kamala não tem revelado consistência e clareza em relação à economia, à melhoria da vida da maioria dos americanos, às enormes desigualdades existentes e às guerras em que os EUA estão envolvidos.
A DESIGUALDADE ENORME NA REPARTIÇÃO DO RENDIMENTO E DA RIQUEZA NOS E.U.A. NÃO DIMINUIU COM BIDEN
Para além das razões anteriores, há ainda uma outra situação social grave, que é a crescente desigualdade na repartição do Rendimentos Nacional e da riqueza (património) nos EUA que aumentou com Biden como revelam os dados do quadro 2.
Quadro 2 – A repartição do Rendimento Nacional e da riqueza nos Estados Unidos da América (EUA) com Trump e Biden – 2017/2022
Como revelam os últimos dados disponibilizados pelo WID, em 2022, a concentração do rendimento atingiu o seu máximo com Biden. Neste ano, 1% da população dos EUA, constituída pelos muito ricos, apropriou-se de 20,9% do rendimento nacional do país, praticamente o dobro do recebido pelos 50% da população americana mais pobre (que ficou com 10,4% rendimento nacional) , e os 10% mais ricos apropriaram-se de 48,3% do rendimento nacional, ou seja, 4,7 vezes superior ao recebido pelos 50% da população mais pobre, que foi apenas 10,4% do rendimento nacional dos EUA. Na repartição da riqueza a desigualdade é muito maior. Em 2022, nos EUA, 1% da população (os muitos ricos) possuíam 34,9% de toda a riqueza do país, enquanto os 50% da população constituída pelos mais pobres possuíam apenas 1,49% da riqueza dos EUA. Durante a presidência de Biden os mais ricos ficaram ainda mais ricos, e os 50% da população mais pobre não viram a fatia que lhes cabe do rendimento nacional e da riqueza dos EUA aumentar. Um verdadeiro fosso social e de rendimentos se criou entre os 50% da população constituídos pelos mais pobres e 1% de muito ricos. E esta enorme desigualdade não deixou de aumentar durante a presidência de Biden. A juntar a tudo isto, há um número crescente de americanos, especialmente os que enfrentam dificuldades económicas ou que veem os investimentos domésticos prioritários não se realizarem (saúde, educação, infraestruturas), que sentem que o governo está a gastar biliões de dólares em conflitos externos sem fim à vista (Ucrânia já 113 biliões de dólares; Israel já 13 biliões de dólares) enquanto as necessidades internas, incluindo as suas, são negligenciadas. É este enorme fosso social que fraturou o eleitorado americano, e permite que discursos populistas, e mesmo mentiras, como os de Trump tenham recetividade em metade dos EUA, e que os políticos da U.E. não compreendem e teimam em ignorar, e os “especialistas” parecem desconhecer, manifestando surpresa, incompreensão e espanto sobre o que acontece nos EUA ( vivem num mundo paralelo).
SERÁ QUE A U.E. E PORTUGAL ESTÃO A CAMINHAR NA MESMA DIREÇÃO?
Segundo o WID (World Inequality Database), em 2022, a percentagem do rendimento nacional de que se apropriaram os muitos ricos (apenas 1% da população) era, na U.E., 11,6% e em Portugal 9,8%, enquanto os 50% da população mais pobre ficaram apenas, respetivamente , com 18,4% e 19,6% do rendimento nacional. Embora a desigualdade na repartição do rendimento não seja tão grande como nos EUA a desproporção entre o que fica para 1% e para 50% da população é enorme. A nível da repartição da riqueza (património) a situação é mais grave. Segundo a WID, em 2022, em Portugal os 1% da população constituída pelos muito ricos possuía 25% da riqueza total (em 2010, era 23,9º%), enquanto 50% da população mais pobre possuía só 3,6% da riqueza total existente do país (em 2010 era 4,54%). Na U.E., em 2022, os 1% da população muito ricos possuíam 24,58% da riqueza total (em 2010, era 23,9%), e os 50% da população mais pobre possuía apenas 3,47% da riqueza total (em 2010, era 3,04%). Também a desigualdade na repartição do rendimento e da riqueza está a criar em Portugal e na U.E. um fosso social enorme entre 50% da população (os mais pobres) e 1% da população (os muitos ricos). E em Portugal a situação agravou-se entre 2010 e 2022.