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Quarta-feira, Julho 17, 2024

Portugal, um país que investe pouco

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Muito abaixo da média dos países da União Europeia, tendo mesmo reduzindo o investimento em % do PIB, e é incapaz (Estado e empresas) de utilizar atempadamente os Fundos Europeus

Numa altura em que se fala tanto de fundos comunitários e que se procura “vender” a ideia de que vão salvar o pais da grave crise que enfrenta (a “bazuca” de António Costa), é importante conhecer o que se está a verificar com os fundos comunitários do “Portugal 2020”. E a realidade é esta: Portugal podia ter utilizado até junho de 2020, 22.818 milhões € de fundos comunitários, no entanto utilizou apenas 12.764 milhões €, ou seja, só 55,9% do que podia ter utilizado, tendo ficado por utilizar 10.054 milhões €. Portanto, é importante não criar expectativas excessivas sobra a “bazuca” europeia para salvar o país. Quem poderá salvar o país são os portugueses.


Estudo

Muito abaixo da média dos países da União Europeia, tendo mesmo reduzindo o investimento em % do PIB, e é incapaz (Estado e empresas) de utilizar atempadamente os Fundos Europeus

Numa altura em que se fala tanto de fundos comunitários e que se procura “vender” a ideia de que vão salvar o pais da grave crise que enfrenta (a “bazuca” de António Costa), é importante conhecer o que se está a verificar com os fundos comunitários do “Portugal 2020” que deviam ser utilizados no período 2014/2020.

Mas antes analisemos a questão do investimento em Portugal. E isto porque o investimento é a base da criação de emprego e riqueza, da inovação, da modernização e do progresso e desenvolvimento um país. Sem ele, o país não renova nem moderniza a sua estrutura produtiva pois a que possui degrada-se, torna-se obsoleta e desaparece. Nos últimos anos, o novo investimento quer publico quer privado em Portugal não tem sido suficiente para compensar aquele que desaparece pelo uso e a obsolescência como mostramos em estudos anteriores utilizando dados oficiais (os nossos estudos 11-2020 e 44-2020). O quadro 1, com dados do Eurostat sobre o investimento público e o investimento total (que inclui o público e o privado) mostra, nesta área vital para o país, o que se tem verificado em Portugal em comparação com a média dos países da U.E., utilizando para isso como indicador a percentagem que o investimento representa em relação ao PIB:

 

Quadro 1 – Investimento público e total em Portugal e nos países da U.E. em % do PIB- 2010/2019

Em 2010, o investimento público em Portugal representou 5,3% do PIB (da riqueza criada no país), enquanto a média na União Europeia foi de 3,6% do PIB. Em 2019, a situação tinha-se invertido pois, no nosso país, o investimento público caiu para apenas a 1,9% do PIB (foi assim que se reduziu o défice), enquanto a média nos países da União Europeia foi de 3% do PIB. Eis a razão da degradação ou inexistência dos equipamentos públicos em Portugal (escolas, hospitais, pontes, transportes ferroviários, etc.) pois sem investimento não se renova, não se amplia, nem se inova nem se constrói nada de novo.

Se a análise for feita agora ao investimento total, que inclui o investimento público mais o investimento privado, a conclusão não é menos grave. Em 2010, em Portugal o investimento total (publico +privado) correspondeu a 20,6% do PIB, enquanto a média, nos países da U.E., no mesmo ano, foi de 20,7% do PIB, praticamente igual. Entre 2010 e 2019, a percentagem que o investimento total representa do PIB, em Portugal diminuiu de 20,6% do PIB para  18,2% do PIB, enquanto a média nos países da União Europeia aumentou de 20,7% do PIB para 22,1% do PIB.

Enquanto em Portugal se reduziu o investimento nos outros países da União Europeia reforçou-se o investimento, tendo aplicado uma parcela maior da riqueza criada em cada ano em investimento. A queda do investimento em Portugal teve como consequência o atraso do país, uma economia frágil com emprego pouco qualificado, baixos salários, onde o aumento da riqueza criada foi conseguido à custa, não do aumento da produtividade, mas do emprego de mais trabalhadores, uma economia dependente do exterior, e não preparada para enfrentar crises como atuais.

 

Apesar da queda do novo investimento, Portugal tem-se revelado incapaz de utilizar atempadamente os fundos disponibilizados pelas União Europeia ao nosso país

Embora Portugal tenha uma necessidade enorme de bom investimento para se desenvolver, para criar riqueza e emprego qualificado, com salários elevados para assim reter e atrair trabalhadores qualificados, e não de mau investimento em estádios de futebol que depois não se utilizam, ou em autoestradas de reduzida circulação, ou em comboios de alta velocidade que depois não têm procura suficiente para suportar os seus custos e que têm de ser financiados pelo O.E., o certo é que o Estado e as empresas têm sido incapazes de utilizar atempadamente e bem os fundos que a União Europeia tem atribuído a Portugal.

E é importante ter presente a experiência da utilização dos fundos comunitários neste momento para não se ser iludido, e não acalentar falsas expectativas de que a “bazuca” da U.E., tão utilizada por António Costa nas suas intervenções,  irá resolver os graves problemas económicos e sociais que o país enfrenta, ou seja, salvar o país. Quem pode salvar o país são os portugueses. A prová-lo estão os resultados da utilização dos fundos comunitários ao longo das últimas décadas que não conseguiram tirar o país do estado de atraso quando comparado com outros países da U.E., nem resolver os principais problemas que o país enfrenta, de que destacamos a baixa produtividade, baixos salários, trabalho precário, aumento das desigualdades, dependência crescente do exterior, domínio dos setores fundamentais da economia por grupos económicos e financeiros estrangeiros, etc..

A tudo isto, ainda se junta a incapacidade que o Estado e empresas tem revelado para utilizar de uma forma atempada e eficiente os fundos da União Europeia (quadro 2).

 

Quadro 2 – O nível de utilização dos fundos comunitários atribuídos a Portugal para o período 2014/2020 em junho de 2020

Segundo a programação financeira anual aprovada pela Comissão Europeia, Portugal podia ter utilizado até junho de 2020, 22.818 milhões € de fundos comunitários, no entanto o executado, ou seja, o utilizado, até junho de 2020 foi apenas 12.764 milhões € (somente 55,9% do que podia ser utilizado), tendo ficado por utilizar, do programado para o período 2014/jun.2020, ainda 10.054 milhões €. Até a junho de 2020, ou seja, após mais 6 anos do início do “Portugal-2020” tinha sido utilizado apenas 51,5% do total de 24.793 milhões € de Fundos comunitários disponibilizados ao nosso país para o período 2014/2020.

Por Programas Operacionais, a situação em alguns deles é ainda mais grave. No Programa Operacional Competitividade e Internacionalização (POCI), um programa fundamental de apoio à modernização e internacionalização das empresas portuguesas, foi executado, até junho de 2020, apenas 57,1%  do programado para o período 2014/jun.2020; no Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POTISE) somente 59,9% foi utilizado; no Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência de Recursos apenas 39,9%; nos Programas Operacionais Regionais (Norte, Centro, Lisboa, Alentejo e Algarve) o executado, até junho de 2020, variou entre 34,8% e 39,3% do programado para o período 2014/jun.2020 para utilização.

Este atraso significativo na execução dos Programas Operacionais do “Portugal 2020”, revelado pelos dados da execução teve consequências graves para o país, já que a utilização dos Fundos Comunitários induz (alavanca) investimento privado e, em alguns programas operacionais, também o investimento público que se deixou de fazer, mas se se tivesse sido realizado era previsível que o país estivesse mais preparado para enfrentar a atual crise.

É por esta razão que não devem ser alimentadas expectativas excessivas sobre a “bazuca” de António Costa/União Europeia, ainda mais quando ainda não chegou um euro ao país, nem se sabe quando chegará, e muito menos se sabe  quando e como serão utilizados (Será em bom investimento ou em projetos que depois são autênticos “elefantes brancos” que têm de ser suportados pelo O.E.?) tendo em conta a experiencia de utilização dos fundos comunitários que acabamos de analisar. E o mais grave é que a “bazuca” está a ser utilizada para manter o subfinanciamento crónico do SNS, da educação e de toda a Administração Pública, em que a perpetuação do congelamento dos salários dos trabalhadores da Função Pública é a face mais visível, e para cortar no investimento público como mostramos no estudo anterior em que analisamos alguns aspetos importantes da proposta de Orçamento do Estado para 2021. A linguagem fria e objetiva dos números oficiais mostra que existe uma enorme diferença entre a propaganda governamental e a realidade. 



 

 


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