Continuamos hoje a falar do palmarés do festival que terminou na noite do sábado passado. A nossa atenção vai agora para as secções de ‘descoberta’, dedicadas a novos cineastas e novas abordagens. Nelas encontramos obras, em muitos casos mais interessantes que muitas que, com pompa e circunstância, passaram na secção oficial. Começamos pela secção “Nuevos Directores” na qual competiram dezasseis primeiros ou segundos filmes dos seus autores. O grande vencedor foi “Le Semeur” de Marine Francen, curiosa abordagem de uma história passada em meados do século XIX numa aldeia francesa que, face à repressão dos republicanos de Luis Napoleon Bonaparte, se vê privada de todos seus homens. Algum tempo passado as mulheres fazem um juramento: homem que apareça na aldeia será “partilhado” por todas elas, para se tornar num verdadeiro povoador.
Filme colombiano “Matar a Jesús” recebeu o Prémio da Juventude
Outro filme que se destacou nesta secção foi “Matar a Jesús” da colombiana Laura Mora, baseado na vivência pessoal da realizadora. O filme conta a história de uma jovem que se cruza com o homem que matou o seu pai, professor da Universidade de Medelin. Isto depois de as autoridades terem sido incapazes de fazer justiça e terem arquivado o caso. O que fazer quando a vingança se torna uma possibilidade real? Este é o tema principal de uma obra dolorosa e inquietante de uma cineasta que conseguiu conquistar a admiração e o afecto das centenas de jovens jurados do Prémio da Juventude.
Prémio ‘Horizontes’ para “Los Perros” da chilena Marcela Said
‘Horizontes Latinos’ é uma área do certame destinado à apresentação de filmes produzidos no último ano nos países da América Latina. O grande vencedor de entre os doze trabalhos apresentados, parte deles vindos do programa ‘Cine en Construcción’, foi “Los Perros”, co-produção chilena-francesa dirigida por Marcela Said. Uma trama amorosa entre uma mulher de 40 anos da alta sociedade chilena e o seu professor de equitação, um ex-oficial de cavalaria vinte anos mais velho do que ela cruza-se com a memória da ditadura de Pinochet, período em que o ex-militar terá tido participação em casos de violação de direitos humanos.
A propósito do cinema latino-americano refira-se que o grande vencedor do “Cine en Construcción” desta edição do Festival foi o brasileiro “Ferrugem” de Aly Muritiba que muito provavelmente veremos a competir no próximo ano.
‘Zabaltegi’ prémio para o francês Clément Cogitore e menção especial para a portuense Filipa César
Nesta secção em que estiveram presentes jovens e consagrados, ficções e documentários, longas e curtas metragens, o prémio foi para “Braguino” de Clément Cogitore. Este é um filme de 49 minutos cuja acção se passa nas inóspitas paisagens da Sibéria. A mais de 700 quilómetros da aldeia mais próxima vivem duas famílias rivais que não se falam. As poucas relações que mantêm são extremamente tensas. Esta foi a situação que o jovem realizador-viajante francês encontrou e serviu de pretexto para um trabalho de base documental que mostra ao espectador um meio estranho em todos os sentidos. Seja pela rudeza das belas paisagens, seja pelo relacionamento (ou falta dele) entre as pessoas.
Foi em ‘Zabaltegi’ que a artista portuguesa Filipa César obteve uma menção especial com o seu “Spell Reel” produção francesa em que a autora, que contou com a colaboração dos cineastas guineenses Sana na N’Hada e Flora Gomes, viaja até ao nascimento do cinema da Guiné-Bissau a partir de material de arquivo, encontrado em 2001, dos primeiros tempos do país independente.
Outra menção especial distinguiu a actriz Darya Zhovner protagonista do filme russo “Tesnota”.
Prémios do Público
“Three Billboards Outside Ebbing, Missouri” filme ‘americano’ do britânico Martin McDonagh, em que Frances McDormand interpreta de forma notável a figura de uma mulher que procura encontrar o violador e assassino da sua filha, foi tal como em Toronto o preferido do Público do Festival. O filme europeu mais votado foi o francês “Jusqu’à la Garde”, de Xavier Legrand, drama em que um casal se vê envolvido em situações de violência doméstica e na disputa pela guarda de um filho menor.
“Life and nothing more” – Prémios FIPRESCI e Signis
Uma referência final para as distinções atribuídas pela FIPRESCI – Federação Internacional da Imprensa Cinematográfica e pela Signis – organização Católica para o Cinema. Ambas decidiram premiar “Life and nothing more” de Antonio Méndez Esparza, filme realizado nos Estados Unidos pelo realizador espanhol. A história com fundo humanista de um jovem que procura um rumo para a sua vida a partir de uma família desestruturada.
A Signis, assinalando os sessenta anos de existência do seu júri em San Sebastián, atribuiu ainda um prémio especial ao filme colombiano “Matar a Jesús”, já referido neste texto.
Como conclusão do Festival de San Sebastián de 2017
E é tudo. Procurámos dizer o essencial a propósito de um festival que teve mais uma vez uma enorme afluência de público e em que os melhores momentos de cinema estiveram nas secções paralelas. Vimos alguns escritos que consideravam a secção a oficial deste ano como a melhor dos últimos anos. Não é essa a nossa opinião. Pelo contrário julgamos que a principal competição do certame basco teve muitos momentos de tédio e de desilusão. Foram poucos os visionamentos de obras que suscitassem entusiasmo e admiração. Esperamos que a edição de 2018 nos possa oferecer uma selecção melhor. Reduzir a quantidade e melhorar a qualidade seria um bom objectivo…
