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Terça-feira, Dezembro 24, 2024

“Príncipes e princesas” no reino da futilidade

Maria do Céu Pires
Maria do Céu Pires
Doutorada em Filosofia. Professora.

Um dos muitos absurdos que se vão tornando lugar-comum na sociedade actual reside numa certa distorção formativa: muitas pessoas deixaram de educar os seus filhos como crianças e jovens, com tudo o que é inerente a estas idades do ciclo de vida, e passaram a ocupar-se das crianças como se fossem “príncipes” e “princesas”.

O que se traduz em todos os aspectos da vida quotidiana, na linguagem, no relacionamento interpessoal, na maturidade e na colocação de objectivos de vida. Podemos perguntar-nos qual a razão de ser deste fenómeno social recente. E devemos, também, questionar sobre as suas interferências no desenvolvimento individual, na estruturação da personalidade, na capacidade de resolver problemas e no futuro das sociedades.

Trata-se de um fenómeno complexo que radica na tendência natural dos pais para desejarem sempre o melhor para os seus filhos. Contudo, o problema, aqui, é precisamente esse: o que é “o melhor”? Que modelos de vida se devem tomar como exemplares? Os de uma “nobreza” já quase inexistente, e que passam pela negação da própria identidade social, histórica e cultural? Os das “estrelas” televisivas e do mundo do espectáculo fácil e vazio de conteúdo, onde não brilham ideias mas apenas lantejoulas? O de um consumismo exacerbado que, em vez de satisfação, é gerador de ansiedade?

O melhor é uma vida de aparência, de escravização relativamente às modas/marcas que o capitalismo, para sua sobrevivência, impõe? Uma vida de futilidade sobrevalorizando o exterior, a imagem e o instante, o passageiro? Uma vida ausente de humanidade e de sentido? Ou o melhor é uma vida construída em alicerces firmes, de valores e de estima por si e pelos outros, desenvolvendo competências pessoais e relacionais de entre ajuda, de solidariedade e de uma convivência saudável?

No fundo, esta elevação a “príncipes e princesas” não corresponderá, igualmente, a uma necessidade de afirmação social, de ascensão no estatuto social de um grupo que agora detém poder (económico ou político) e prefere esquecer as suas origens em vez de as assumir com dignidade? Não é isto apenas mais uma faceta do “deslumbramento” que ofusca os novos-ricos que, na sua ganância, menosprezam a generosidade e os verdadeiros valores?

Narcisismo e individualismo extremo associado a um relativismo absoluto; ausência total de compreensão e de respeito pelos outros, só podem conduzir ao vazio e à arrogância.

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