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Quarta-feira, Julho 17, 2024

Que adianta cansar-me?

Vitor Burity da Silva
Vitor Burity da Silva
Professor Doutor Catedrático, Ph.D em Filosofia das Ciências Políticas Pós-Doutorado em Filosofia, Sociologia e Literatura (UR) Pós-Doutorado em Ciências da Educação e Psicologia (PT) Investigador - Universidade de Évora Membro associação portuguesa de Filosofia Membro da associação portuguesa de Escritores

Viajo este interior aberto onde passos se ouvem num corredor chamado vida, uma rotina sensível que abranda as esquinas e nos ensina a aprender com tardes infinitas, um belo cenário num descampado a sul e as águias dispersas numa nuvem de sonho.

Repito-me incansável manhãs sem fim, o horizonte em que canto da sala neste deserto imenso onde nuvens viajam saudades, sinto a hóstia divina divagar a minha alma cansada da espera e nada acontece. Adorava sentir vozes cansadas para que me refutassem ânsias, ventos moribundo e incansáveis viajarem por estas estradas a nascer do cansaço, das noites do baldio sob o escuro, a iluminação das praças e o mercado a abrir madrugada ainda, viajo sempre amigo, é um presépio eterno na minha alma desaforada e mendigada por tardes soltas, observar como tanto gosto do mar a desflorar-se contra as rochas e eu nesta sala descrevendo sentimentos sentidos e nunca cansados, é verdade, entendi há dias isso mesmo, que me adianta cansar-me? A gente prende-se a estas diásporas dos dias e de repente até parece nada existir, olhamos à nossa volta e nada, talvez impressão minha, o rio flui tão sóbrio que a tarde atrasa o aparecer da noite, as nuvens desaparecem num luar que chega entretanto e nada, é tudo tão absoluto, tão real, imagino entretanto o baldio de há anos neste quintal antes meu e agora de tantos, o bar cansado e os indígenas sentados numa sofreguidão de bramir, importa aí uma leitura das coisas um pouco mais precisa, mais concisa, menos premente ou doente, acordar aos sobressaltos e acreditar na vida, vencer o tédio e viver as ruas da nossa vida, é verdade.

Imaginam-me um sonho enquanto disperso este absoluto incansável, corro os corredores da vida e vislumbro na distância uma ausência de vida, não, é tudo imaginação do cansaço quando as tardes se eternizam, sabes?, as tardes assim também me cansam mas nunca me farto, é tão vasta a vida nas janelas escondidas que a gente descobre em cada gole o silêncio de anos perdido ou escondido, por isso uma viagem longa para contentar o esplêndido, o contido nesta casa fechada à beira mar onde anos ali passados com leituras cansadas a cultuarem-me, adoro reviver as distâncias por isso me embrenho nas viagens onde me emprenho de vento e sal.

Desfolho cada página do dia como um recomeço catártico,
embrenho-me nele e dele a saudade nunca visitada, relembro apenas e pronto, o resto é o caminho da viagem amalgamada no banco de trás deste carro sem cor. E dizem-me que nada tem cor, que importa então se assim é?, eu descubro nas minhas ânsias a cor dos meus sentidos e neles me impregno caminhando, pisando a areia solta das saudades e dos vultos admirados, a admiração pelas estepes, o vulto vago do dilúvio, a sede de amarguras indo devagar até que mais um dia seja ultrapassado nesta erma cama para um dia finado.

Alguém do lado num amor fraterno, o amor é quente, penso, e porque se esquecem as memórias de ideias por viver?


do livro Reflexões Profundas,
Vítor Burity da Silva
Crónicas


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