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João de Sousa

Segunda-feira, Novembro 4, 2024

Que prioridades na cooperação Lusófona?

Delmar Gonçalves, de Moçambique
Delmar Gonçalves, de Moçambique
De Quelimane, República de Moçambique. Presidente do Círculo de Escritores Moçambicanos na Diáspora (CEMD) e Coordenador Literário da Editorial Minerva. Venceu o Prémio de Literatura Juvenil Ferreira de Castro em 1987; o Galardão África Today em 2006; e o Prémio Lusofonia 2017.

Um breve contributo

 

Em quantas partes se vive um Grito?
Em quantos corações se parte a terra?
Em quantos olhos se come o sol?
E em quantos pães se mata um sonho?

O que significa neste mundo o miolo de um pão obsceno às metades na mesa de seis bocas?
E em quantas partes se
morde um bife de nervo
até ao delírio do osso no
espaço tenro do mundo?
E neste poema em quantos trapos se esconde o rei da fome de cada um e levanta a cabeça o preciso verso da fome de cada Lei?”

Só a Educação e a Cooperação  podem  Responder!

A situação da educação melhorou muito nas últimas décadas na América Latina e na Ásia Oriental, onde os objectivos fixados pela UNESCO, há vinte anos atrás, de garantir o ensino básico  primário a todos foi atingido na quase totalidade, mas continua, pelo contrário, a ser preocupante na África Subsahariana, onde a melhoria  foi de apenas 6% em 10 anos, passando a escolarização de 54% para 60%. O que quer dizer que 40% das crianças africanas em idade escolar não têm ainda acesso ao ensino básico primário. A questão da educação em África continua, portanto, a ser um motivo de preocupação para os governos, mas sobretudo para as famílias e para as crianças e jovens que vêm assim o seu futuro comprometido, pois, sem educação, não há desenvolvimento. Mas nós sabemos também como dá jeito para alguns (normalmente uma minoria) que a ignorância e a dependência se perpetuem.

Um dos valores mais urgentes reclamados pela História Universal actual é a Tolerância. Num universo que se unifica, o encontro das diversidades pode ser mortífero, se estas não se compuserem no sentido de mutuamente se enriquecerem com as suas diferenças. Só a educação pode operar este milagre. A tolerância deveria ser o reconhecimento do outro, a coexistência, o apreço, o acolhimento e a tentativa de uma permuta permanentemente criativa e criadora. Que só encontra limites face ao intolerável.

A tolerância, aspiração do espírito humano tantas vezes sufocada, desvirtuada, desfigurada, desviada com todas as formas do intolerável, num conflito maior de força e de direito. A resolução desse conflito só poderá advir de um acréscimo de lucidez, de dignidade e de solidariedade finalmente conquistadas e não apenas de uma solidariedade ou caridade ambíguas ou de uma indiferença cínica. Como dizia Paulo Freire, ”Quem inaugura a negação dos homens não são os que tiveram a sua humanidade negada, mas os que a negaram negando também a sua.”

Com uma cooperação educativa centrada em experiências inovadoras e nas decisões e responsabilidades, baseada em experiências respeitadoras da liberdade, ao fazê-lo estaremos a contribuir para duradouros processos autonómicos. Nós acreditamos que ninguém é autónomo e diferente, primeiro, para depois decidir com clareza e clarividência. A autonomia vai-se constituindo na experiência de várias, inúmeras decisões, que vão sendo tomadas. Só assim construiremos o futuro na inclusão, no pressuposto de que a verdadeira liberdade se desenvolve e amadurece no confronto com outras liberdades.Para que tal suceda é necessário o espírito crítico e autocrítico que se adquire na educação.

O hábito do diálogo universalista permanente na diferença é algo primordial no encontro/reencontro dos homens para a sua verdadeira humanização. A coexistência harmoniosa pressupõe uma relação entre seres diferentes ou não, uma relação que é concomitante com o aparecimento dos seres, harmoniosa ou não. E a cultura de cidadania é aquela que defende e respeita o direito a ser diferente, é aquela que é sempre inclusiva e que apresenta e possui características interculturais.

Perante os quase imprevisíveis e, por vezes, dificilmente controláveis dinamismos que conjunturalmente parecem perspectivar o futuro, assistimos anestesiados ao desmoronar de ideais e de esforços colectivos no sentido de preservar valores até há bem pouco óbvios, alguns dos quais decisivos para o relacionamento e a interdependência entre povos aparentemente ligados pela história, pela língua e, mesmo, por parentescos.

Só aceitando, sem compromissos os erros, as qualidades, os defeitos e as diferenças dos seres humanos dentro deste espaço geoestratégico alicerçado na Língua e na História, é possível escapar à lamentação estéril dum passado sem remissão e entrever com propriedade os caminhos difíceis e inexplorados, duma interdependência cultural desejável, mas mais abrangente e activa, impedindo que seja letra morta. Podem pois criticar-se o passado (que existiu), os rumos que a história tomou, a incapacidade ou teimosia que levaram e levam os homens do poder a persistirem em erros desde sempre conhecidos e reconhecidos.Temos no entanto de aceitar que foi essa história comum que nos foi legada e que nos faz agora caminhar irremediavelmente juntos na aventura da construção (ou desconstrução conjunta) e reconstrução de um mundo marcado por um destino comum e universal, para além de todas as barreiras e diferenças. A vida não devia nem deve funcionar segundo a lógica da exclusão.

O princípio AB UNO DISCE OMNES não é aceitável, não somos vazos prontos a ser eternamente esvaziados. Como dizia o grande RABINDRANATH TAGORE “A vida renovada volta sempre a esse frágil vaso tantas e tantas vezes esvaziado, o tempo passa e tu continuas a fluir e há sempre espaço para receber as suas dádivas. ”Há compromissos que devem ser assumidos e escrupulosamente respeitados. A Educação é o maior deles. Uma educação para o desenvolvimento e solidariedade entendida esta última como prática de informação e conscientização para a formação de uma mentalidade nova, mais aberta, dinâmica, universalista e solidária. Para que tal se concretize é preciso coragem, ousadia e inconformismo, num momento em que as nossas sociedades integram uma pluralidade cada vez maior de pessoas de proveniências culturais, religiosas e até linguísticas. O certo é que colhemos sempre o que plantamos.

Porque ensinar, aprender e partilhar dentro do espaço da CPLP exigem disponibilidade para o diálogo, o diálogo genuíno permite-nos aprender a compreender, aprender a aprender e reaprender, aprender a respeitar, aprender a lidar e respeitar com as diferenças, aprender a saber ouvir, aprender a ser coerentes entre o que dizemos e fazemos, aprender as virtudes e a importância de saber escutar pacientemente. Há mais de dois mil anos, LÚCIO SÉNECA terá dito “nenhum vento será favorável a quem não saiba a que porto se dirige”. Será! Mas o caminho da Cooperação, da educação, da fraternidade, da união e da Luta permanente para a superação e autosuperação facilmente farão que o vento nos ajude. E é nesta óptica de clara fertilização por via da cooperação e partilha na educação que se encontrarão bons modelos de coexistência harmoniosa descomplexada rumo ao FUTURO!

Meus irmãos da CPLP:

Tudo começou aqui
Minha alma de Poeta
Minha aura de Africano
Minha alma Mestiça
Incolor
de negro e branco feita adição
Descobri acenos da europa no Africano que sou
e visões de áfrica no Mestiço que mora em mim
Que jamais recusará
os glóbulos caucasóides
e negróides que coabitam em mim
Orgulhoso que sou
do meu sangue Luso-Africano
das heranças de Bragança e Chuabo
para a eternidade”.

Por isso, pretendo tão só que seja este texto a ser ouvido, compreendido, devorado e não o Poeta que o escreve, como os meus irmãos MAKONDES que sabem a aura de mistério e segredo que rodeia a preparação das máscaras e da dança propriamente dita, e consideram importante que não se conheça a identidade do dançarino. Oxalá então que sejam muitos os que querem ficar no e com este texto no coração e na mente. E só nessa altura fique eu calado como um um enorme pássaro Xirico sentado aos pés de uma pedra, a entrar decididamente pelo ar dentro das pessoas!

 

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