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Sábado, Novembro 2, 2024

O rasto do dinheiro por trás da “nova agenda verde”

Arnaldo Xarim
Arnaldo Xarim
Economista

De repente a onda da nova agenda verde de medidas radicais para “parar” as mudanças climáticas tornou-se a mais recente coqueluche e até o grande potentado da globalização económica e o Fórum de Davos (Fórum Económico Mundial) deu enorme destaque ao tema, chamando até a intervir a jovem Greta Thunberg.

Quererá isto dizer que a elite económica mundial está verdadeiramente empenhada no combate às prejudiciais alterações climáticas ou apenas que já terá encontrado a via para preparar uma significativa mudança nos fluxos globais de capital, onde as grandes corporações financeiras podem continuar a lucrar; que outra coisa se poderá esperar quando assistimos ao conclave dos grandes directores de fundos de investimento de capital do mundo e dos principais banqueiros centrais do mundo?

Al Gore

No Fórum de Davos deste ano cruzaram-se Al Gore, presidente do Climate Reality Project e principal patrocinador de Greta Thunberg, Christine Lagarde, a ex-directora do FMI e actual presidente do Banco Central Europeu, Mark Carney, o ex-presidente do Banco da Inglaterra e agora consultor de mudança climática do primeiro-ministro inglês Boris Johnson, David M. Rubenstein, o influente fundador do Carlyle Group, Feike Sybesma, do gigante do agronegócio Unilever e que também é presidente-executivo do Fórum de Alto Nível de Liderança em Competitividade e Preços de Carbono do Grupo Banco Mundial, e Larry Fink, fundador e CEO do grupo de investimentos BlackRock e o mais improvável de todos os impulsionadores da nova agenda verde.

A BlackRock não é um fundo de investimento normal, antes o maior gestor de activos do mundo – gere um montante aproximado de 7 biliões de dólares (valor que é superior ao PIB conjunto de França e Alemanha, as duas maiores economias da EU), distribuído por mais de 100 países – que domina as principais bolsas mundiais e grandes accionistas das principais empresas de petróleo e das maiores empresas de carvão do mundo. Ainda assim, e no que aparenta uma completa inversão de estratégia, divulgou poucos dias antes do Fórum de Davos um boletim para os CEOs empresariais onde afirma que as alterações climáticas constituem um factor determinante nas perspectivas de longo prazo das empresas, que uma tal perspectiva começa a ser assimilada e que os riscos climáticos já estão a levar os investidores a reavaliar as principais premissas sobre os modelos de financiamento, concluindo que o risco climático é um risco de investimento e porque os mercados de capitais antecipam riscos futuros, Fink espera para breve uma realocação significativa de capital, através, nomeadamente, da constituição de carteiras de activos que substituam os investimentos nas empresas e nos sectores dos combustíveis fósseis (petróleo e carvão) e reforcem o compromisso com a sustentabilidade e a transparência nas actividades de gestão de investimentos… Perante tanta confiança e assertividade de um dos principais barões do capital transnacional quase apetece resumir, dizendo que quem não seguir as orientações do IPCC (Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas) da ONU na construção da sua carteira de activos, arrisca-se a perder dinheiro!

Greta Thunberg

Reforçando a sua recente veia ecológica, Larry Fink indica no seu boletim o TCFD (Task Force on Climate-related Financial Disclosures, ou Equipa para Divulgações Financeiras Relacionadas com o Clima) e o SASB (Sustainability Accounting Standards Board ou Conselho de Normas Contabilísticas de Sustentabilidade) como importantes fontes de informação sobre os riscos relacionados com o clima, mas revela afinal quem realmente suporta esta nova onda. O TCFD foi criado em 2015 pelo Bank for International Settlements e é presidido por Mark Carney, governador do Banco da Inglaterra e membro do conselho de Davos, ex-governador do Banco do Canadá e ex-Goldman Sachs; o TCFD, a City of London Corporation (o órgão municipal da área financeira de Londres) e o governo do Reino Unido, criaram em 2016 a Green Finance Initiative, com o objectivo de canalizar biliões de dólares para investimentos “verdes” e apresenta profundas ligações ao FSB (Financial Stability Board, entidade que monitoriza e apresenta recomendações sobre o sistema financeiro global). O já citado TCFD é presidido pelo bilionário Michael Bloomberg e inclui, além do BlackRock, o JP MorganChase, o Banco Barclays, o HSBC (Hong Kong and Shanghay Banking Corporation), a Swiss Re (a segunda maior resseguradora do mundo), o ICBC (Industrial and Commercial Bank of China), a Tata Steel, a petrolífera ENI, a Dow Chemical, o gigante da mineração australiano BHP e a Generation Investment Management de Al Gore; já o SASB, entidade que tem assessorado os grupos financeiros que direccionam o fluxo de capital global para os principais projectos de mineração de carvão e petróleo, inclui, além do BlackRock, os fundos Vanguard, Fidelity Investments, Goldman Sachs, State Street Global, Carlyle Group, Rockefeller Capital Management e vários grandes bancos como o Bank of America e o UBS.

E são estas as impolutas entidades que irão reorientar as empresas em direcção a uma economia mais verde, ajudadas certamente por outras entidades tão insuspeitas como os dirigentes dos principais bancos centrais – como é o caso do governador do Banco do Japão, Haruhiko Kuroda, que foi citado pela Reuters quando afirmou que o «…risco relacionado com o clima difere de outros riscos, pois é muito menos previsível e o seu impacto a longo prazo significa que os efeitos durarão mais do que outros riscos financeiros», ou da presidente do BCE, Christine Lagarde, quando assegurou que aquele banco lutará para cumprir uma assumida missão climática – que há algum tempo vêem incluindo os riscos ambientais nos seus discursos sobre inflação e estabilidade monetária.

Christine Lagarde

De uma forma ou outra, parece cada vez mais evidente que este impulso por uma acção climática dramática tem mais a ver com uma tentativa de justificação para uma grande reorganização da economia global do que para um modelo de energia que implique uma redução drástica dos padrões de vida globais. Isso mesmo foi já assumido por Otmar Edenhofer, o líder de um dos grupos de trabalho do Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, quando disse numa entrevista ao Neue Zürcher Zeitung, em 2010, que é preciso acabar com a ideia que a política climática internacional é uma questão ambiental, porque esta é na realidade apenas um meio de redistribuição da riqueza.

E que melhor forma de o fazer senão através dos maiores controladores de dinheiro do mundo, como o BlackRock, ou com a colaboração de um centros financeiros com maior opacidade, como a City londrina?


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