Eis as respostas claras e sem “lapsos de memória” de José Sócrates às calúnias, insinuações e innuendos que o PSD / CDS mais o Ministério Público têm suscitado contra ele perante a passividade e indiferença da própria direcção do PS. (nota do Director)
Respostas às perguntas da Comissão Parlamentar de Inquérito à recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do Banco
I – Introdução
Senhor Presidente
Senhores Deputados,
Recebi a notificação dessa Comissão e as perguntas que me endereçaram. Antes de responder, no entanto, gostaria de fazer algumas considerações políticas prévias que não devo evitar. A primeira é manifesta: apesar do período abrangido pelos trabalhos da Comissão ser aquele que vai de 2000 até ao presente, eu fui o único antigo primeiro ministro a ser convocado para prestar depoimento. E não posso deixar de notar que esta singular distinção teve a concordância do partido que apoiou o governo que liderei. Depois, não ignorando o Parlamento que decorre em tribunal a fase de instrução judicial que abrange algumas das questões que me são agora colocadas, nem por isso os senhores deputados prescindem de as colocar. A inquirição política passa assim a fazer parte do jogo judicial – a acusação do Ministério Público justifica as perguntas politicas e estas, por sua vez, reforçam a acusação. Um jogo de legitimação recíproca que tem, ao menos, a vantagem de tornar claro o quadro de fundo: eis a política e a justiça de mãos dadas para, em conjunto, ignorarem o principio de presunção de inocência ( dispensando a acusação de ser provada) e transformarem o processo judicial num litígio no qual o visado deve defender-se em duas frentes – na frente política e na frente judicial. Se a esta última ainda é exigível que prove o que diz em tribunal, à primeira basta usar a segunda para partir imediatamente para o ataque, para o insulto e para o seu verdadeiro objetivo – o ódio ao adversário político. Sem necessidade de mais formalismos, a acusação do Ministério Público torna-se, assim, instrumento bastante para a política dispensar a apresentação de provas ou a realização de julgamento. No final, a maior perversidade é chamar a isto processo equitativo.
Quem ler as perguntas que me são colocadas percebe imediatamente o seu objetivo e o terreno de jogo em que se pretendem colocar. Elas não se destinam a procurar honestamente os factos ou a esclarecer seja o que for : elas visam usar politicamente o processo judicial em curso para provocar, para atingir, para ferir. Na verdade, não procuram resposta alguma – elas visam apenas o enxovalho público. Toda uma cultura política. Pouco importa se a acusação é verdadeira, se houve julgamento e sentença e muito menos lhes importa a inocência. O que parece ser importante é substituir a presunção de inocência, principio base do direito moderno, pela presunção pública de culpabilidade. Afinal, foi assim desde início. Não me resta, portanto, outra alternativa senão a de responder às questões colocadas pelos senhores deputados antes de o fazer, como em princípio deveria acontecer, no respetivo tribunal. Não caio na armadilha de invocar direitos individuais : sei exatamente o quanto estes valem para o jornalismo e o respeito que merecem aos partidos políticos. Para este mundo da política e da televisão invocar direitos ou inocência constitui imediatamente forte indício de culpabilidade.
Assim sendo, em legítima defesa do meu nome e da minha reputação política, tomo a decisão de me defender imediata e publicamente de tão infames, injustas, absurdas e falsas imputações. Decidi responder por blocos de temas que, no seu conjunto, dão resposta às diversas perguntas dos grupos parlamentares. Julgo ser este o método mais adequado e o que torna o conjunto das respostas mais compreensível. No final, incluo um índice de correspondência entre os capítulos das respostas e as perguntas. Vou, então, direto ao assunto começando por
II – Vale do Lobo
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Começo pelo princípio, para lembrar que esta imputação do Ministério Público se iniciou sem nenhuma referência à Caixa Geral de Depósitos, mas sim ao PROTAL, o Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve. Seis meses depois da decisão de prisão preventiva, a imputação de factos que me foi apresentada afirmava que a aprovação em Conselho de Ministros do Plano Regional de Ordenamento Territorial do Algarve, o PROTAL, teria tido como objetivo “ beneficiar o empreendimento de Vale do Lobo, concretamente a respetiva estrutura acionista.” O PROTAL tornou- se desta forma um símbolo no processo Marquês. Não apenas por ter sido o primeiro mas também por ter sido o único facto concreto de corrupção que me foi formalmente apresentado no espaço de dois anos e meio após a prisão. Dois anos e meio. Sobreviveu todo esse tempo nos jornais e nas televisões até desaparecer sem glória, afogada em ridículo e em disparate. Vale a pena conhecer a sua história.
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Como expliquei na altura em que tal suspeita me foi comunicada não sabia quem eram os acionistas do empreendimento de Vale do Lobo, não conhecia o Presidente do Conselho de Administração da empresa ( perguntaram duas vezes, como se fosse surpresa para eles), não conhecia o senhor de nacionalidade holandesa que era mencionado nos autos ( autor de uma transferência à qual sou totalmente alheio e que os investigadores consideravam suspeita), nem nunca tinha discutido ou trocado impressões sobre o empreendimento de Vale do Lobo fosse com quer que fosse. Em suma, Vale do Lobo não me dizia nada – nem como tema pessoal, nem como tema político.
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Tive também ocasião de explicar pacientemente porque é que a imputação me parecia estapafúrdia. Desde logo porque, tendo sido Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, conhecia suficientemente a legislação em vigor para saber que os Planos Regionais de Ordenamento do Território não conferem quaisquer direitos a particulares, tendo as suas normas uma natureza estratégica, de definição de grandes linhas de orientação para o ordenamento territorial de uma determinada região, que deverá ser depois adoptada e seguida pelos Planos Diretores Municipais, Planos de Pormenor e Planos de Urbanização. Assim sendo, a aprovação do PROT do Algarve não poderia ter atribuído qualquer beneficio ao empreendimento de Vale do Lobo. Além disso, a memória que tinha do referido Plano é que ele tinha sido contestado exatamente por ser demasiado restritivo e que me parecia, portanto, impossível que pudesse favorecer qualquer empreendimento turístico – fosse o de Vale do Lobo ou qualquer outro. Em suma a acusação parecia-me absolutamente infundada e absurda. Pareceu–me, sinceramente, que naquela sala ninguém tinha a menor ideia do que era um plano regional de ordenamento e que o caso PROTAL não passava de uma tentativa desesperada de arranjar alguma coisa sobre o tema da corrupção. Saí do interrogatório convencido que, no respeitante ao PROTAL, me parecia fim de conversa. Estava enganado, o caso estava apenas no início.
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Terminado o interrogatório, o inquérito prossegue no local onde o Ministério Público se sente mais a vontade – as páginas dos jornais. Agora a suspeita já não é o Plano propriamente dito, mas uma retificação à versão inicial do Plano relativa a Zona Terrestre de Proteção. Os jornais adoraram este pormenor – oh, retificação, lá está: só pode significar benefício escondido. O Ministro do Ambiente da altura explicou, em nota enviada ao Ministério Público, que a retificação em causa se fez para prevenir quaisquer ambiguidades que pudessem resultar do facto do mesmo conceito ter duas formulações distintas no mesmo diploma. No entanto, não havia dúvida que as duas versões eram equivalentes, não trazendo a referida retificação nenhuma alteração substancial ao Plano. Ao fim de meses de insistência nos jornais, os factos acabaram por se impor: as duas versões são, nas suas consequências, exatamente iguais e daí não poderia advir qualquer beneficio fosse para quem fosse. A suspeita parecia vencida.
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Ficamos por aqui? Ainda não. Tudo tendo sido desmontado, é altura para o Ministério Público usar as televisões para publicitar a nova suspeita, recentemente descoberta: desta vez é relativa ao ponto nº 6 da Resolução do Conselho de Ministros que consagra uma norma de exceção à aplicação das orientações do Plano Regional. Norma de exceção, nova suspeita, nova longa batalha de explicação.
A referida norma de exceção foi elaborada pela CCDR- Algarve, entidade responsável pela elaboração do projeto de revisão do PROT e foi incluída na sua proposta inicial que foi colocada em consulta pública em agosto de 2006. Ela teve, portanto, uma origem técnica, fundada numa prática de bom planeamento. Por outro lado a norma em causa constitui uma técnica legislativa habitual que visa a salvaguarda dos princípios constitucionais de proporcionalidade, segurança jurídica e proteção da confiança. Normas equivalentes foram utilizadas na elaboração de diferentes PROTs, como é o caso do PROT da área metropolitana de Lisboa, PROT do Oeste e Vale do Tejo e PROT do Alentejo, entre outros. Finalmente, a cláusula de exceção em causa não se aplicou a Vale do Lobo, já que à data da sua entrada em vigor não havia qualquer plano de pormenor ou de urbanização em elaboração para aquela zona. A invocação desta norma como destinada a atribuir uma vantagem ilegítima é, portanto, absurda.
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Fico com dúvidas se a história não estará detalhada demais. Não vejo, todavia, outra forma de a contar sem estes pormenores que, se hoje parecem infinitamente ridículos, durante dois anos de intensa campanha mediática eles foram levados muito a sério. No entanto, para quem acompanhou o processo e não se perdeu nas múltiplas patranhas que os vários jornais contaram, a imputação do PROTAL pareceu exatamente aquilo que foi: um ato de desespero da investigação para encontrar indícios suspeitos, quaisquer que eles fossem. Primeiro foi o plano em si; depois as retificações; depois as exceções. Para depois, dois anos e meio depois, acabar abandonada no caminho deixando o seu miserável rasto: a tentativa de transformar um ato meritório do governo em ato duvidoso, senão desonesto, através de uma maldosa campanha mediática promovida criminosamente pelo próprio Ministério Público.
Não houve qualquer equívoco ou mal entendido nesta atitude. O que se passou foi intencionalmente injusto e desleal. Afinal, o Ministério Publico bem sabia que não determinei o início do referido Plano, não influenciei qualquer aspeto dos seus termos, não propus a sua aprovação, não dei nenhuma orientação, nem discuti tal matéria com qualquer técnico envolvido ou com qualquer membro do governo. Estes são os factos que tornam esta imputação particularmente infame, injusta e disparatada.
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Em 2017, três anos depois, inicia-se, então, o segundo andamento. Vale do Lobo muda de pauta e de narrativa – se não foi o PROTAL, foi o financiamento; se não houve corrupção no PROTAL, houve então no empréstimo da Caixa ao empreendimento. Diz a acusação:
“Os arguidos JOSÉ SÓCRATES e ARMANDO VARA mantinham uma relação de confiança recíproca e de amizade, tendo sido colegas de Governo… O arguido JOSÉ SÓCRATES pretendia utilizar a sua proximidade ao arguido ARMANDO VARA para tomar conhecimento, por via do mesmo, de operações em curso na CGD, acordando com o mesmo o apoio do acionista Estado, quando necessário, para fazer prevalecer decisões, designadamente em sede de concessão de crédito …o arguido JOSÉ SÓCRATES tendo conhecimento da operação de financiamento em causa …aceitou vir a manifestar o seu apoio às decisões que viessem a ser proferidas no sentido de conceder os financiamentos pretendidos para a aquisição do empreendimento Vale do Lobo, ainda que preterindo a salvaguarda dos riscos e dos interesses da própria Caixa Geral de Depósitos »
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Ainda custa a ler. Mas vejamos ponto por ponto. Para efeitos de análise, a acusação é composta por três elementos. O primeiro diz respeito à relação de confiança recíproca e amizade entre mim e Armando Vara o que é totalmente verdade, embora não escape a ninguém a forma maliciosa como está escrito, pretendendo sugerir que por detrás desse natural companheirismo político esconder-se-ia, afinal, uma qualquer maldosa cumplicidade.
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Avancemos. O segundo elemento é a base de todo o conjunto : Armando Vara terá sido nomeado administrador por minha indicação ou por minha influência. Acontece que isso é completamente falso. Completamente e comprovadamente falso. Ouçamos o depoimento do então Ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, na Comissão de inquérito parlamentar :
“O primeiro-ministro nunca me pressionou no sentido de fazer qualquer mudança, nem de nomear fosse quem fosse para a CGD. Foi iniciativa minha. …Santos Ferreira e Armando Vara foram escolhas minhas. (Armando Vara) fez carreira na Caixa, era diretor, tinha conhecimento dos cargos de direção da Caixa e capacidade de liderança… era uma pessoa conhecida e cumpria o critério de ser alguém com carreira na Caixa. Foi meu colega no governo de Guterres, que eu conhecia o que me dava algum conforto”.
Nunca pressionei para mudar a Administração e nunca indiquei ninguém para o seu Conselho. O antigo Ministro não podia ser mais claro. Todavia, teve ainda a honestidade de referir, em interrogatório judicial, que, na altura em que me apresentou os nomes que propunha, eu lhe exprimi reservas ( relativas à controvérsia política que a nomeação poderia gerar e de nenhuma forma relacionadas com a capacidade para o exercício do lugar) a essa nomeação. Por dever de reserva, que sempre observei em assuntos internos do governo que liderei, nunca revelei em minha defesa este facto, apesar da sua evidente relevância. Agora que foi dita em público, sinto-me à vontade não apenas para a confirmar inteiramente, mas também para dizer que ela era conhecida de muita gente que permaneceu em silêncio durante todos estes anos em que estas mentiras foram repetidas vezes sem conta no espaço público. Mas deixemos isso de lado. O que aqui é relevante é isto – é falso, comprovadamente falso, que tenha combinado com Armando Vara a sua nomeação ou que tenha sugerido sequer o seu nome para vir a ocupar o lugar de administrador da Caixa geral de Depósitos.
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Finalmente o terceiro elemento da acusação é ainda mais disparatado: “ tendo conhecimento da operação de financiamento em causa… aceitou vir a manifestar o seu apoio às decisões que viessem a ser proferidas”. É falso que alguma vez tenha tido conhecimento da referida operação de crédito como é igualmente falso que a Administração da Caixa Geral de Depósitos precise, ou solicite o apoio do Estado para fazer prevalecer decisões de concessão de crédito. Essas decisões, durante os meus Governos, foram sempre tomadas pelos órgãos do banco sem necessidade de consultar o acionista, como foi o caso de Vale do Lobo. E se as decisões são do Conselho, são dele também as respetivas responsabilidades por ser seu dever avaliar o risco das operações em que se envolvem e velar pela gestão sã e prudente da instituição. Em todas as declarações dos membros da gestão da Caixa e da administração de Vale do Lobo é possível retirar esta conclusão – nunca, nem a mim nem a ninguém do governo, foi dado conhecimento ou discutido, ou pedido qualquer tipo de orientações a propósito de tal empréstimo.
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A questão central é a seriedade desta acusação. O mais perturbador não é que o Ministério Público tenha mudado de acusação dois anos depois da primeira imputação. Não é sequer que tenha acusado sem provas, mas que tenha acusado após ter reunido suficientes provas de que a acusação é falsa. Não é que não haja provas, porque elas existem. O que acontece é que todas elas – as declarações dos membros do Governo, as declarações dos membros da Administração da Caixa Geral de Depósitos, as declarações dos administradores do empreendimento Vale do Lobo e ainda os documentos apreendidos provam exatamente o contrário do que é afirmado pela acusação e insinuado nas perguntas : a decisão da concessão do crédito foi tomada pelos órgãos competentes do banco sem nenhuma intervenção da tutela governamental. Está igualmente provado que não indiquei Armando Vara para a Administração da Caixa e que nunca expressei, nem prometi vir a expressar, apoio algum a qualquer decisão de financiamento do banco, nem perante membros do governo nem perante membros da administração da Caixa ou ainda perante qualquer cliente do banco.
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Em síntese: depois de cinco anos de acusações públicas pretendendo envolver-me em Vale do Lobo, tudo o que se apurou apenas confirma o que disse no primeiro momento: nunca discuti fosse com quer que fosse nenhuma operação de financiamento de Vale do Lobo e nunca manifestei, nem nunca me foi pedido, qualquer apoio à decisão de financiamento – aliás, nem a essa nem a qualquer outra operação de crédito da Caixa Geral de Depósitos. Nunca reuni, discuti, ou dei qualquer orientação a qualquer membro do conselho de administração relativamente a esta ou outra qualquer operação de crédito. Acrescento ainda, porque me é perguntado, que a acusação de que terei recebido alguma transferência monetária de promotores do projeto de vale do Lobo é absolutamente falsa e injusta e não pretende outra coisa que não seja insultar sem provas ( aliás, o melhor que conseguiram como “prova” é uma escuta de uma conversa telefónica que se desenvolve entre terceiros e que não diz respeito a Vale do Lobo e à qual me referirei adiante). A pergunta que resta, afinal, é esta : a que direito vai a direção do Ministério Público buscar a legitimidade para produzir uma acusação destas? Na verdade, não se trata de direito, mas de poder: o poder de investigar, de acusar, e de liminarmente condenar – nos jornais, nas televisões, na rua. E o poder vai até ao fim do seu poder.
III – o Ministro Campos e Cunha
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É chegada a hora de responder às provocações e às mentiras que o antigo Ministro, ao longo dos anos, foi espalhando em público sobre a sua passagem pelo governo. Devo, antes do mais, dizer que a verdadeira razão da sua demissão nada tem a ver com a Caixa Geral de Depósitos ou com qualquer questão política relacionada com programas de investimento público. Na verdade, ela tem a ver com assunto mais prosaico : a sua oposição a uma lei que o governo aprovou ( mais uma vez com a sua concordância) e que ficou conhecida como a lei do “um terço” . Recordo que, na altura em que o governo iniciou funções, era permitido aos funcionários públicos aposentados continuarem a trabalhar no Estado acumulando o vencimento com a pensão. A situação era injusta a vários títulos e o governo decidiu altera-la, exigindo que o aposentado escolhesse entre duas alternativas – ou um terço do salário acrescido da pensão completa, ou um terço da pensão mais o vencimento. Uma coisa ou outra. A aprovação desta lei desagradou-lhe fortemente por razões pessoais – o ministro estava justamente nessa situação. Esta foi a verdadeira razão para a sua saída, razão essa que é conhecida por todos aqueles que estavam no governo da altura. É, aliás, a essa lei que o ministro se refere quando fala de populismo na sua carta. Foi dessa forma que expressou o seu desconforto na reunião do Conselho de Ministros, apesar de, no final, a ter também aprovado. Nenhum membro do governo o acompanhou : a lei em questão era não só razoável como de elementar justiça (havia, aliás, outro membro do governo nessa situação, que interveio para apoiar a lei que considerava correta e oportuna). Seja como for, foi a partir desse momento que o Ministro me começou a escrever cartas pedindo para sair do governo, a que sempre respondi pacientemente apelando à responsabilidade que tinha assumido quando livremente aceitou integrar o Governo. O episódio do artigo do jornal, que conto a seguir, fez-me, finalmente, perceber que o que estava em causa não eram problemas políticos mas problemas de caráter dos quais, aliás, já me tinha apercebido quando, ainda antes de tomar posse e sem me consultar, o Ministro indigitado fez declarações públicas defendendo o aumento do imposto sobre o valor acrescentado.
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Esta foi a razão. Agora tratemos da ação, isto é do que se passou no dia da sua demissão. Em 14 de julho de 2005, na quinta feira em que habitualmente se reúne, o Conselho de Ministros aprovou o programa de investimentos em infra- estruturas prioritárias que há muito vinha sendo preparado internamente e que fazia parte do plano económico do governo. Depois de discutido, teve o acordo final do Ministro das finanças. No fim de semana seguinte, salvo erro no domingo, o Ministro escreveu um artigo num jornal manifestando divergências com o plano que tinha aprovado alguns dias atrás. Achei que tinha ido longe demais e que a sua atitude violava os elementares deveres de lealdade para com o governo como órgão coletivo. Na quarta feira seguinte convoquei-o para a residência oficial de São Bento e, logo que entrou na sala, comuniquei-lhe que tinha decidido exonera-lo das suas funções. Estando a reunião com o senhor Presidente da República agendada para daí a uma hora e não havendo tempo a perder, dei-lhe a escolher : ou o despacho de exoneração seria feito mencionando a minha decisão ou, se essa fosse a sua vontade e como é costume da República, deixar-se-ia referido oficialmente no Diário da República que a exoneração se dava a seu pedido. Respondeu-me que preferia a ultima. Perguntei-lhe então que razão deveria ser explicitada, ao que ele respondeu: cansaço. Assim foi. No final da audiência deixou uma carta que tinha previamente escrito. Nunca li essa carta. Melhor, só a li agora, desde que consta dos autos do processo Marquês. Foi isto que se passou e que foi testemunhado por quem – e são muitos – acompanhou, no interior do governo, este deplorável episódio.
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Finalmente quero desmenti-lo. Não é verdade que alguma vez o tenha pressionado para mudar a Administração da Caixa Geral de Depósitos. Isso nunca passou de uma miserável falsidade e de uma pobre e lamentável encenação para justificar a sua saída do Governo. Pelo contrário, foi o então Ministro da Finanças que, pela primeira vez e logo no início do governo, me referiu a necessidade de fazer mudanças na administração da Caixa Geral de Depósitos expondo, para isso, duas razões. A primeira tinha a ver com o Presidente do Conselho de Administração que o Ministro entendia não ter nem os conhecimentos do sector, nem as qualificações na área financeira necessárias para o exercício do cargo, referindo-se a essa nomeação como escandalosamente partidária. Por outro lado, segunda razão, criticou várias vezes a posição de complacência da Administração da Caixa com a decisão do anterior Governo de integrar o fundo de pensões da instituição na segurança social. Dei- lhe, como sempre dei a todos os Ministros das Finanças, carta branca para fazer a mudança que pretendia e para me apresentar as escolhas que viesse a fazer. Nunca lhe sugeri nome nenhum- repito : nunca lhe sugeri nenhum nome . O que aconteceu então foi que o Ministro não fez absolutamente nada, deixando, durante um longo período, a Administração da Caixa sem solução – nem propunha a sua substituição nem confirmava a confiança nela. O episódio mais caricato aconteceu durante a Assembleia Geral em que o representante do Estado (indicado pessoalmente pelo ministro da finanças e atuando diretamente em seu nome) se recusou a confirmar a confiança na administração ou, em alternativa, a demiti-la como a lei expressamente consagra. Eis o que ficou consignado em ata:
“ Passou- se, depois, ao quarto ponto da Ordem do Dia tendo o senhor Vice –Presidente da mesa dado a palavra ao senhor representante do Estado que, no uso dela, manifestou que o acionista procedeu à apreciação da administração e fiscalização da sociedade. Feita esta declaração o senhor Dr. Oliveira Rego suscitou a questão de a mesma( a declaração do representante do Estado) não satisfazer os requisitos do artigo 455º do Código das Sociedades Comerciais, que prescreve que a referida apreciação deve concluir por uma deliberação positiva ou negativa. O senhor Vice-Presidente leu a citada disposição legal confirmando que a lei estabelece que a referida apreciação deve concluir por uma deliberação de confiança em todos ou alguns órgãos de administração e de fiscalização e respetivos membros, ou por destituição de algum ou alguns destes. O senhor Vice Presidente perguntou ao representante do Estado se mantinha a declaração feita ( que não expressava confiança nem propunha destituição), ao que este respondeu afirmativamente”
O comportamento do representante do Ministro das finanças era não apenas insólito mas constituía também um gravíssimo erro de gestão por parte do acionista que, desta forma e sem apresentar alternativa, deixava irresponsavelmente enfraquecida a liderança do banco. A tentativa de correção que, dias mais tarde, veio a fazer, apenas contribuiu para expor, ainda mais, o erro inicialmente cometido. A ata da reunião refere :
“ o acionista Estado enviou à Caixa Geral de Depósitos, já depois de finda a assembleia, mas antes de a presente ata ter sido elaborada, um documento, datado de 20 de junho corrente, que fica arquivado, em que esclarece o sentido da proposta que apresentou e votou sobre este ponto da Ordem do Dia e que é a seguinte: “ de acordo com a lei, o acionista procedeu à apreciação da administração e fiscalização mantendo a confiança nos respetivos órgãos”.
Eis o ponto a que tinha chegado a situação. E, neste ponto, sem desculpas – todo o processo foi da responsabilidade do Ministro e diretamente conduzido por ele sem procurar conselho de ninguém do governo. A imprensa, conhecedora dos factos, criticou severamente – e justamente – a situação em que ficava a administração do banco, a incapacidade do Ministro e a indecisão do Governo. A referência na carta que deixou no momento da sua demissão é não apenas falsa, mas também injusta para todos os membros do governo : “ a pressão sistemática relativa à substituição da CGD é contraria às reformas que este grupo necessita e recuso-me a alterar as pessoas sem uma estratégia” . Na verdade, ninguém o impediu de ter uma estratégia ou a de a implementar – esse era aliás o seu dever. Também não é verdade que alguém lhe tenha sugerido que apenas mudasse pessoas sem uma estratégia, como insinua na sua carta. Na verdade, ninguém o interpelou para nada mais que não fosse para resolver o problema que ele próprio havia criado e que afetava a imagem de todo o Governo. Referiu várias vezes em Conselho que iria proceder a mudanças na Caixa mas que o iria fazer propondo um novo modelo de gestão para o banco. Ficamos à espera que o fizesse. Como em muitos outros assuntos, nem mudou os nomes nem o modelo de governação. Enquanto isso, a situação da direção da instituição bancária apodrecia e vários membros do governo, em várias ocasiões, chamaram a atenção- como fazia toda a imprensa – para a necessidade de dar solução ao assunto da Administração da Caixa e para que se tomasse uma decisão, qualquer que ela fosse. É a esta situação que o antigo ministro chama, maliciosamente, de “pressões”. Eis a eterna habilidade da mediocridade – transformar o fracasso em razão de queixa.
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Na verdade, aqueles que já viveram o suficiente sabem que existe um escol na política portuguesa formado por aqueles que, tendo encontrado nas vitórias do PS o espaço de afirmação social que há muito ambicionavam, viriam a demonstrar mais tarde uma completa impreparação para o exercício de lugares executivos. Incapazes de conviver com o fracasso decidem então passar o resto da vida aproveitando todas as oportunidades para demonizar a ação dos governos e dos dirigentes do PS – nuns casos por ressentimento, noutros por sobrevivência. Afinal, só a direita política lhes garante espaço e audiências nos jornais. Enfim.
IV – A crise na Administração do BCP
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Acompanhei a crise na administração do Banco Comercial Português pelos jornais. Será talvez conveniente lembrar que a razão do conflito nasceu do conhecimento público de que o referido banco usava empresas off shores, criadas e geridas pelos próprios administradores ou titulares de cargos na alta direção do banco, com o objetivo de manipular o valor das suas ações. Atos desonestos que viriam a ser, mais tarde, confirmados em tribunal. Estas práticas, das quais nunca tive conhecimento antes de serem noticiadas, afetaram a reputação do banco, geraram uma crise na sua Administração e levaram a uma disputa de poder que foi decidida em Assembleia Geral de acionistas. Anos depois, aqueles que foram condenados pelas práticas ilegais e derrotados na assembleia geral, viriam a recorrer a um clássico: a tese da intervenção política – a sua derrota não se deveu aos delitos cometidos mas foi, isso sim, consequência de uma ilegítima intervenção do poder político da altura. Acontece que esta tese da conspiração política é completamente inventada. Nunca – repito, nunca- orientei, sugeri ou discuti com qualquer acionista do banco comercial português as escolhas a fazer para a sua administração. Nunca me reuni com acionistas ou grupos de acionistas para falar sobre a administração do BCP e também isso nunca me foi solicitado por qualquer dos envolvidos na disputa. Também não é verdade que tenha “mantido reuniões com o Dr. Paulo Teixeira Pinto durante o período critico da alteração do administração do BCP”. Nunca foi do meu conhecimento que a Caixa tinha decidido conceder crédito a acionistas do BCP nem tal assunto foi alguma vez discutido dentro do governo ou entre mim e o Ministro das Finanças. Para mim e para o Ministro das Finanças a crise no BCP era da exclusiva competência dos acionistas do banco e não da competência do governo. E, não o sendo, o governo não intervinha dando qualquer tipo de orientação fosse a quem fosse e muito menos à Caixa Geral de Depósitos, nem permitiria que alguém o procurasse envolver. Deixo mais uma vez claro que a Caixa não comunicava ao acionista as decisões de crédito que tomava nem quaisquer outras operações bancárias concretas que realizava e que eram da sua inteira e única responsabilidade.
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Fui informado pelo Ministro das Finanças, salvo erro no final de 2007, que o Presidente da Caixa Geral de Depósitos e o administrador, Dr. Armando Vara, lhe haviam comunicado terem aceitado o convite que lhes foi dirigido por um conjunto de acionistas para integrar uma lista de candidatos à gestão do BCP. Não falei com nenhum deles sobre essa decisão. Para o Ministro, como o próprio afirmou nessa comissão, isso representou uma contrariedade, já que tencionava reconduzi-los nos seus cargos. Ficou então encarregado de nomear uma nova equipe, em particular um novo presidente, o que foi feito pouco tempo depois. Foi tudo.
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O que é absolutamente espantoso é que uma tal patranha – a conspiração entre Governo e Banco de Portugal para tomar de assalto a administração de um banco- tão vazia de evidências e tão óbvia na sua motivação, tenha encontrado sustento nos meios jornalísticos e políticos , e não apenas nos partidos mais ligados aos visados. A intenção dos autores não é outra que não seja a de justificar o seu fracasso profissional e fazer esquecer as responsabilidades pelos atos ilegais que praticaram, fazendo–o, aliás, sem escrúpulo, procurando, injusta e levianamente, envolver pessoas completamente estranhas ao caso. A vingança que agora desencadeiam sobre o senhor governador do banco de Portugal é o paradigma desta atuação indigna.
V – Vítor Constâncio
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O caso Vítor Constâncio suscita varias perplexidades. A primeira talvez seja a de confirmar o indomável caminho que uma notícia falsa pode fazer, sobretudo se ela visar a reputação de alguém já na mira da política. A distinção entre a operação de crédito ao senhor José Berardo – da exclusiva responsabilidade da Caixa Geral de Depósitos – e a atribuição de idoneidade para deter participação qualificada num banco, esta sim da responsabilidade do Banco de Portugal, não é difícil de entender. Não obstante, apesar de todas as explicações e de todas as clarificações, a fraude continuou, imparável, o seu caminho, sem que nenhum movimento de simples decência lhe tivesse feito frente.
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Nunca discuti com o senhor Governador do Banco de Portugal qualquer assunto relacionado com a crise na administração do BCP ou com financiamentos da Caixa Geral de Depósitos, nem ele alguma vez mostrou qualquer intenção de discutir tais matérias comigo ou com o governo. A independência do Banco de Portugal prevista na lei foi sempre seguida de forma escrupulosa. Na verdade, a história de um conluio entre mim, o Ministro das Finanças e o Governador do Banco de Portugal não passa de uma tese mal intencionada e desesperada que visa por um lado desviar as atenções dos problemas causados ao BCP por parte de quem a invoca e que, por outro lado, tem o propósito de atacar covardemente o meu governo com base numa narrativa para a qual, ao fim de todos estes anos e com tanta gente envolvida, não apontam nenhum facto que a sustente. Talvez seja preciso repetir o óbvio: os únicos responsáveis pelo empréstimo ao senhor José Berardo são os administradores da Caixa Geral de Depósitos – os únicos.
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Igualmente extraordinária foi a reação unânime de todos os Partidos políticos. Sem fazerem o mínimo esforço para compreender, para estudar ou para refletir sobre a questão por um minuto que fosse, todos se apressaram, com base numa notícia enganosa, a condenar o comportamento do antigo Governador, como se este tivesse mentido aos deputados ou omitido deliberadamente alguma coisa à Comissão. Nem uma coisa nem outra. O que ficou evidente – em desfavor da sua credibilidade – é que, desde inicio, a Comissão definiu os seus alvos. Na verdade, há muito que Vítor Constâncio o é dos partidos da direita, a diferença agora é que se tornou o alvo de todos – incluindo daquele de quem foi secretário geral e que o ataca tão injustamente como todos os outros.
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Todavia, a unanimidade política não tem o poder de transformar uma mentira em verdade oficial, por mais que a história seja conveniente e o alvo perfeito. O Banco de Portugal não aprovou a operação de crédito nem poderia de nenhuma forma alterar ou anular esse empréstimo. Não podia. Nem legalmente nem de qualquer outra forma, já que se o fizesse estaria a desrespeitar os direitos dos outros e a abusar da sua autoridade. Ir “além da lei” significa viola-la e isso tem um nome no código penal – prevaricação. A naturalidade com que tal enormidade se sugere na televisão é um preocupante sinal da cultura política destes novos tempos que vivemos e nos quais os abusos das autoridades são recebidos sem censura, senão com satisfação. “Ir além da lei” é de facto de antologia.
VI- Senhor José Berardo
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Nunca reuni com o senhor José Berardo em 2007. A única reunião de trabalho – a única – que tive com ele decorreu no meu gabinete, a pedido da então Ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, para discutir a possibilidade de um acordo entre o Estado e a Fundação Berardo para que a sua coleção fosse exposta no Centro Cultural de Belém. Essa reunião aconteceu antes do acordo que foi assinado a 3 de Abril de 2006 e nunca mais tive qualquer outra reunião de trabalho nem acompanhei o desenrolar das negociações, que decorreram no respetivo Ministério da tutela. Quero reafirmar, como já fiz publicamente no dia da inquirição do Dr. Filipe Pinhal, que nunca discuti, conversei ou orientei o senhor José Berardo em qualquer investimento ( aliás, não tinha com ele qualquer relação que permitisse uma conversa desse tipo). Nunca tive conhecimento, fosse por quem fosse, do empréstimo que este negociou com a Caixa Geral de Depósitos para reforçar a sua posição acionista no Banco Comercial Português, assim como não tinha conhecimento que a Caixa, ou o restante sector financeiro, realizassem empréstimos tomando como garantias ações de bancos. Nunca sugeri a ninguém- acionista ou não acionista – que requeresse empréstimos na Caixa para tomar ou reforçar posições no banco comercial português. Tal assunto nunca foi discutido dentro do Governo nem o discuti com o Ministro da Finanças. Na verdade, só tive conhecimento desse financiamento em concreto exatamente no mesmo momento em que todos os portugueses souberam – no início dos trabalhos dessa Comissão Parlamentar.
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No entanto, a miséria moral chegou a tal ponto que nesta comissão o Dr. Filipe Pinhal referiu uma pretensa conversa com o senhor Joe Berardo em que este lhe terá dito que “ ainda estou para saber como é que aquele homem me enfeitiçou, como é que aquele homem me deu a volta…” Para, então, a partir daqui, concluir que “aquele homem” só poderia o Dr. Teixeira Pinto ou eu próprio. E, acrescenta, só poderia ter sido eu já que a palavra daquele não teria peso suficiente para influenciar o senhor José Berardo. Este comportamento não tem outro objetivo que não seja senão procurar envolver o meu nome na história seja de que forma for, nem que seja preciso recorrer à forma mais abjeta de intriga, de insinuação e de mentira.
VII – Opa da Sonae à PT
Esta pergunta é, de todas elas, aquela onde é mais evidente o seguidismo partidário do PSD com a acusação do Ministério Público. Como expliquei no texto de introdução, julgo que é mesmo essa a intenção dos deputados que a formulam- legitimar com a inquirição política a acusação do Ministério Público. Não posso, portanto e como expliquei na introdução, aceitar que outro dever se possa sobrepor ao meu legítimo direito a defender-me imediatamente de tão graves e infundadas alegações que, embora disfarçadas de perguntas legítimas, esse facto só as torna mais indignas. Vamos ao assunto PT
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Comecemos pela neutralidade. Todos os que seguiram o desenvolvimento da operação da opa da Sonae sobre a PT – e foram muitos – puderam comprovar a posição do governo ao longo de todo o processo- neutralidade. Neutralidade na atuação administrativa, neutralidade nas declarações públicas. A posição do governo sempre foi a de que deveria ser o mercado a decidir. Afinal, tratava-se de uma disputa entre competidores portugueses e não havia razões políticas substanciais para exprimir reservas em relação a qualquer deles. O interesse do governo, desde o início, foi outro e mais importante para a política de telecomunicações: garantir que desta operação resultaria mais concorrência no sector – no essencial, isso significava a separação das redes de cobre e cabo. Esse foi o nosso principal objetivo. E foi conseguido. A autoridade da concorrência aprovou essa separação como medida obrigatória durante o processo da opa e os dois contendores viriam a inclui-la nos seus projetos. Finalmente, na Assembleia Geral que decidiu a contenda, o Estado votou pela abstenção demonstrando assim a sua boa fé em todo o processo. O despacho do Sr. Secretário de Estado do Tesouro – que, com base na proposta dos serviços competentes decide, em nome do governo, dar orientações ao representante do Estado para se abster na votação – é mais uma prova destes factos que contradizem a história do Ministério Público, a história da Sonae e a história da direita política portuguesa. A alegação de que o governo estaria a fingir neutralidade e em segredo a apoiar a PT, não é sustentada em evidência alguma mas em pura maledicência – ela não tem ponta por onde se pegue.
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Perguntam, de novo, pelo voto da Caixa na OPA. Esclareço, mais uma vez, que o governo não deu qualquer orientação à Caixa Geral de Depósitos- nem a nenhum dos seus administradores – sobre o voto da OPA, em rigoroso respeito pela autonomia da Caixa e escrupulosamente fiel à sua política de neutralidade. A Caixa votou sem outra consideração que não fosse o seu próprio interesse. Isso mesmo foi testemunhado por todos os que participaram no Conselho de Administração da Caixa que deliberou a posição do banco.
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Nunca falei com Ricardo Salgado sobre a opa da Sonae. Nunca recebi dele nenhum pedido ou pressão sobre este assunto nem direta, nem indiretamente. Também me vejo obrigado a dizer que nunca recebi do grupo BES, nem da empresa Lena ou de qualquer outra empresa, qualquer quantia monetária ou outro qualquer bem, como vergonhosamente os deputados do PSD me perguntam, sabendo que a pergunta me ofende e sem terem nenhuma razão para o fazer que não seja seguir o que é sugerido pelo Ministério Público.
Mas regressemos ao tema das pressões. Posso e devo dizer que o único concorrente que efetuou abertamente essa pressão foi a Sonae. Dias antes da assembleia geral o presidente do conselho de administração da Sonae, Dr. Paulo Azevedo, telefonou-me pedindo expressamente a intervenção do Governo para que a Caixa Geral de Depósitos votasse a favor da Sonae. Reafirmei, nesse telefonema, a nossa posição de neutralidade e transmiti-lhe que não via nenhuma razão de interesse público para alterar a minha posição ou a do governo. Portanto, e para responder à pergunta do PSD : sim, houve pressões sobre o governo , mas vieram da Sonae- e tenho testemunhas do que afirmo. Não, “não estavam todos feitos”, como disse o Dr. Paulo Azevedo – o meu Governo não estava “feito” com a Sonae, nem com ninguém.
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Uma ultima nota. O assunto PT vai para além das perguntas que me foram colocadas e que, no caso, não vem a propósito. Há, no entanto, um ponto que me parece implícito nelas e que quero rebater. Na verdade, a relação do Governo com a PT durante todos esses anos foi sempre conflituante .O interesse do Governo era promover mais concorrência ; a da PT era manter as suas históricas posições hegemónicas no mercado das telecomunicações. O que nós fizemos ao longo dos seis anos foi acabar com esse monopólio. Nos principais indicadores de cota de mercado os números de 2004 e de 2011 são definitivos: no serviço de televisão a quota de mercado da PT era de 80%, baixou para 35%; no telefone fixo era de 94% passou para 53%; finalmente na internet a PT tinha 82% do mercado quando o Governo iniciou funções e em 2011, quando terminou, a PT tinha apenas 49%. Estes números são públicos e são oficiais. Em seis anos, e em consequência de uma política de promoção de concorrência, fundamental para o êxito do plano tecnológico, o monopólio da PT nos serviços de telecomunicações acabou. A alegação – e o embuste – de que o meu governo estava ao serviço dos acionistas da PT não resiste aos factos : na verdade, o meu Governo acabou com o monopólio efetivo que a PT teve durante muitos anos.
VIII – A escuta entre Laurentino Dias e Armando Vara
Devo começar por esclarecer – o que é maliciosamente ocultado na pergunta do PSD- que a escuta referida tem a ver com o autódromo do Algarve e não com Vale do Lobo. A mesma manha usaram os senhores procuradores – ela foi apresentada como “prova” de que eu teria tido intervenção na atribuição da concessão de crédito a Vale Do Lobo. “Prova”, imaginem. Como todos podem ver, nem a conversa escutada diz respeito a Vale do Lobo nem eu intervenho na conversa : ela é entre terceiros e apenas pode responsabilizar quem nela participa. Que a mesma escuta seja utilizada pelo PSD nesta inquirição diz muito sobre a própria acusação e o comportamento do Ministério Publico no processo de que fui alvo .
Resta esclarecer outros quatro pontos : primeiro, nunca ninguém, dentro do Governo( incluindo o então secretário de estado Laurentino Dias) , ou fora do dele, me requereu qualquer intervenção relativamente a qualquer concessão de crédito ao autódromo do Algarve; segundo, nem eu, nem o Ministério das Finanças, alguma vez interviemos, fosse em que assunto fosse, nas decisões de concessão de crédito da Caixa Geral de Depósitos; terceiro, todo o Governo sabia que era essa a nossa posição de principio; quarto, nunca fui tratado como “chefe” dentro do meu partido.
IX – Projeto La Seda /Artland
Esse projeto foi apresentado à comissão de avaliação e acompanhamento dos projetos de “potencial interesse nacional” e, segundo os critérios definidos no diploma legal que criou essa figura, obteve essa classificação. Essa comissão de avaliação tem caráter interministerial e é presidida pela agência para o investimento e comércio externo de Portugal, na altura tutelada pelo Ministério da Economia. Recordo-me de participar numa cerimónia de início de construção da fábrica que valorizaria o conjunto petroquímico de Sines e de nessa altura ter sido apresentado o projeto pelos investidores. Parece- me também justo e oportuno dizer – o que parece ter sido transformado em segredo- que o projeto da empresa Artland, que o governo classificou como PIN em 2006 e cujos licenciamentos só terminaram em 2008, foi totalmente realizado. A fábrica de PTA ( ácido tereftálico purificado, matéria prima usada no fabrico de PET, plástico usado na industria de embalagens ) foi construída e os postos de trabalho criados. A empresa foi vendida em 2017 a uma outra empresa que está, neste momento, a operar no limite da capacidade de produção – 700 000 toneladas por ano, fazendo o complexo industrial de Sines subir na escala de valor e trazendo um significativo contributo líquido para as exportações portuguesas. E muito impressionante verificar que nunca houve uma referência na comissão a este simples facto – o projeto PIN foi construído, os postos de trabalho foram criados e a fábrica esta a operar.
Na verdade o discurso político na Comissão e que está subjacente a todas as perguntas – de todos os partidos, incluindo aquele que na altura compunha o governo- é de certa forma tentar responsabilizar o governo alegando que foi a classificação do projeto que terá gerado imparidades na caixa Geral de Depósitos. Ora , isso não é verdade : a classificação de qualquer projeto como de potencial interesse nacional não o habilita automaticamente para financiamento e não significa qualquer garantia pública. Isso é conhecido por todo o sector financeiro quando toma as suas decisões. Separemos, portanto, estes dois pontos – um, a decisão de classificar um projeto como de interesse nacional que é da competência do órgão da administração pública previsto na lei ( o racional do projeto sempre fez sentido e por isso está construído e a funcionar) ; outro, totalmente distinto é a concessão de crédito pela Caixa Geral de Depósitos cuja competência é do seu Conselho de Administração.
Acrescento, para responder às perguntas, que nunca entrei em contacto com nenhum administrador da Caixa Geral de Depósitos para interceder pelo projeto, não foi dada nenhuma orientação pelo Governo, nem me reuni com os promotores do projeto. Essas matérias, que diziam respeito a investimento de raiz e à criação de postos de trabalho- e que eram importantes para o Pais – eram seguidas pelo Ministério da Economia. Também tenho que afirmar que jamais o Governo deu qualquer tipo de orientação à Caixa sobre projetos de potencial interesse nacional, nem sobre sectores económicos ou mercados a privilegiar. A visão do Governo nunca foi a de uma economia planificada nem dava orientações concretas para além das orientações gerais que constam das cartas de missão entregues aos gestores públicos no início de mandato. Regressando ao projeto em referência, nunca soube, nem tinha que saber, qual era a situação da empresa, a sua estratégia ou as suas dificuldades. Nada sei sobre reuniões de membros do governo com administradores da Caixa, mas não quero deixar de dizer que não acredito que algum membro do Governo tenha dado orientações ou instruções à Caixa para concretizar qualquer tipo de financiamento. Mais uma vez e para que não restem duvidas : a gestão da Caixa tinha inteira liberdade para decidir apoiar ou não apoiar com operações de crédito, os projetos que lhe fossem apresentados.
X – Aerosoles
Nunca tive qualquer conhecimento da necessidade, ou intenção, desta empresa de realizar qualquer operação de crédito junto da Caixa Geral de Depósitos. Não acredito que nenhum membro do Governo desse orientações à Caixa Geral de Depósitos em assuntos que eram da exclusiva responsabilidade da administração do banco. Em resposta anterior expus a posição de princípio do Governo relativamente a esta matéria.
XI – Finpro
Nunca tive qualquer conhecimento de qualquer operação de crédito relacionada com esta empresa. O mesmo é válido para os investimentos do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social. Repito: nunca, nem neste caso nem em qualquer outro, fiz qualquer tipo de sugestões ou dei instruções a administradores da Caixa Geral de Depósitos, nem nunca nenhum membro do Governo me abordou com esse propósito. O princípio seguido pelo Governo na relação com a Caixa consta de respostas anteriores.
XII – Professor Paz Ferreira
Nunca chegou ao meu conhecimento qualquer “alerta” do professor Paz Ferreira relacionado com a política de concessão de crédito da Caixa Geral de Depósitos. Como explicou o antigo Ministro das Finanças Teixeira dos Santos nessa Comissão, em nenhum momento as informações remetidas ao Governo deram nota de qualquer recomendação ou conselho ao Estado para alterar ou decidir o que quer que fosse no exercício da função acionista. A lei é clara: sobre matérias de gestão o acionista só pode deliberar a pedido do órgão de administração.
XIII – Faria de Oliveira
Nunca foi do meu conhecimento qualquer assunto político relacionado com exposição da Caixa ao BCP. Não conheço a carta do engenheiro Faria de Oliveira, nem a discuti com o senhor Ministro das Finanças. Essa matéria – a exposição do crédito da Caixa a outros bancos – é da responsabilidade e da competência da administração porque só ela estava em condições de fazer juízos sobre o risco das suas operações de crédito. No limite, se a situação o justificasse, devia comunica-la ao Banco de Portugal na sua qualidade de supervisor bancário. Nas minhas conversas com o Senhor Governador do Banco de Portugal tal assunto nunca foi mencionado.
XIV – Considerações finais em resposta a duas questões prévias
- Ao longo da vida, nunca suportei o abuso- em particular o abuso de autoridade, aquele que é o mais perigoso justamente porque é cometido em nome de todos, em nome do “nós”, em nome da “Nação”. Fico exatamente com esse sentimento quando vejo deputados que se acham no direito de fazerem perguntas a cidadãos sobre as razões que os levam a exercer os seus direitos previstos na lei – como se o exercício desses direitos carecesse de justificação perante as autoridades. Os deputados do PSD decidiram questionar-me sobre a minha opção de responder a esta Comissão por escrito e a essa pergunta respondo da única forma que posso : a lei não vos dá o direito de perguntar porque razão decido usar um direito que, para ser usado, não precisa de ser A pergunta em si é um abuso – mas duvido que isto ainda signifique alguma coisa para o PSD.
- Não desejo também deixar sem resposta a pergunta relativa à ação do meu Governo e à Caixa. Em primeiro lugar que o meu Governo sempre respeitou a autonomia de gestão da administração da Caixa Geral de Depósitos e nunca interveio em matérias que eram da competência da administração do banco – e , em consequência, da sua responsabilidade. O Parlamento já fez duas Comissões de Inquérito e ouviu dezenas e dezenas de testemunhas. Pois bem, em nenhum momento – repito, em nenhum momento- se ouviu alguém dizer que eu, ou o Ministro das Finanças que tutelava essa área política, alguma vez tenhamos tentado intervir nesses assuntos, dando orientações ou fazendo sugestões. Essas alegações foram desmentidas por todos os que prestaram declarações. Não obstante, as acusações não param. Elas são repetidas e repetidas – talvez na esperança que, de tanto repetir, se possa esconder a evidência de não haver indício algum que possa sustentar tão injusta alegação.
- A este propósito, faço mais uma observação para chamar a atenção para um facto absolutamente insólito. Nas duas comissões de inquérito só houve um momento – um único momento- em que um administrador se referiu a uma intervenção do Governo na Caixa : a venda da posição que o banco detinha na Cimpor à empresa brasileira Camargo Correia. O anúncio de aceitação da venda foi feita 26 minutos após o lançamento da OPA. Segundo os jornais, o antigo administrador Nogueira Leite terá afirmado na Comissão de Inquérito que “ a Caixa Geral de Depósitos foi pressionada pelo conselheiro especial do governo de Passos Coelho para as privatizações ( António Borges)” adiantando ainda que “a venda da cimenteira foi contra a opinião do administração da caixa Geral de Depósitos”. Esta intervenção é de legitimidade muito discutível, mas ninguém sugeriu que o Primeiro Ministro da altura prestasse depoimento. Na verdade, ninguém mais falou no assunto. Julgo que será fácil imaginar o que aconteceria se tivesse sido um assessor meu a dar instruções à administração da Caixa para vender a Cimpor a uma empresa brasileira.
- Para terminar, gostaria ainda de dizer que, para formular um juízo sério sobre a gestão da Caixa nesses tempos de Grande Recessão, seria talvez mais justo fazer um esforço de comparação das suas imparidades e das operações de crédito das quais que resultaram perdas significativas , com as que se verificaram nos restantes bancos portugueses que foram capitalizados com a ajuda do Estado ( ou, ainda, de comparação com o que aconteceu no sistema financeiro europeu) . A pergunta óbvia afinal é esta : como compara a Caixa Geral de Depósitos com os restantes bancos – teve mais ou menos imparidades, teve mais ou menos crédito concedido com um risco que, hoje, parece inaceitável ? Infelizmente não me parece que este ponto esteja na agenda da Comissão.
Ericeira , 4 de julho de 2019
- Capítulo II – Resposta às perguntas número 1e, 1f , 2a e 2b , i, ii e iii, do grupo parlamentar do BE; perguntas 6, 7, 8, 9, 35, 36 37 e 56( em parte), do grupo parlamentar do PSD; perguntas 3 e 1 (em parte) do PS
- Capítulo III– Resposta às perguntas número 1 ( segunda parte) do grupo parlamentar do PS; perguntas 3, 4 e 5 do grupo parlamentar do PSD, perguntas 1a, 1b, 1c, 1d, do BE
- Capítulo IV– Resposta às perguntas 7i, 7ii e 8 do grupo parlamentar do PS; às perguntas 10, 11, 12, 18, 19 20 21 e 22 do grupo parlamentar do PSD e ás perguntas 3a, 3b , 3c e 3d do grupo parlamentar do BE
- Capítulo V- Resposta à pergunta 28 do grupo Parlamentar do PSD e a parte da pergunta 2d iii do grupo parlamentar do BE
- Capítulo VI – Resposta às perguntas 2 d i, ii e iii ( outra parte)do grupo parlamentar do BE; 2, 6i e 6ii do grupo parlamentar do PS; 13, 14, 15, 16, 17, do grupo parlamentar do PSD
- Capítulo VII – Resposta às perguntas 31, 32, 33 e 34 56( em parte) do grupo parlamentar do PSD
- Capítulo VIII – Resposta às perguntas 44, 45 e 46 do grupo parlamentar do PSD
- Capítulo IX – Resposta às perguntas 2c , i, ii, e iii do grupo parlamentar do BE ; 38, 39, 40 41, 42 e 43, 52 e 53 do grupo parlamentar do PSD
- Capítulo X – Resposta à pergunta 47 do PSD
- Capítulo XI – Resposta às perguntas 48, 49, 50 e 51 do PSD
- Capítulo XII – Resposta às perguntas 23, 24 e 25 do grupo parlamentar do PSD
- Capítulo XIII – Resposta às perguntas 26, 27, 28, 29 e 30 do grupo parlamentar do PSD
- Capítulo XIV – Resposta às perguntas 1 e 2 do grupo parlamentar do PSD
Por opção do autor, este artigo respeita o AO90
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