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João de Sousa

Sábado, Novembro 2, 2024

Revolução Democrática no Irão

Paulo Casaca, em Bruxelas
Paulo Casaca, em Bruxelas
Foi deputado no Parlamento Europeu de 1999 a 2009, na Assembleia da República em 1992-1993 e na Assembleia Regional dos Açores em 1990-1991. Foi professor convidado no ISEG 1995-1996, bem como no ISCAL. É autor de alguns livros em economia e relações internacionais.

O assassinato de uma jovem detida pela Polícia iraniana da ‘moralidade islâmica’ por não cobrir a cabeça da forma oficialmente exigida provocou uma revolta do povo iraniano exigindo o fim da ditadura clerical e a instalação da democracia no país.

Os iranianos já enfrentaram as forças repressivas antes, mas desta vez estão a fazê-lo de forma maciça, contínua e nacional, apesar das balas, das centenas de vítimas mortais e das dezenas de milhares de detenções. As estimativas feitas no dia 7 pelas unidades de resistência apontavam já para quatrocentas vítimas mortais e vinte mil presos, com especial incidência no Baloquistão e no Curdistão mas abrangendo desta vez a totalidade do país e todas as classes sociais.

O divórcio entre o povo iraniano e o clero opressor é um facto que mesmo aqueles que durante décadas fizeram campanha para apaziguar os fanáticos estão agora a admitir.

Os funcionários do regime clerical foram forçados a reconhecer que os protestos são nacionais e contaram com a direção organizada das unidades de resistência do Conselho da Resistência Nacional do Irão (CNRI), ou a sua principal componente, a Organização Mujahedin do Povo do Irão (os hipócritas, de acordo com o nome oficial depreciativo).  As autoridades iranianas ameaçam abertamente atingir os iranianos afiliados na Resistência Iraniana na Albânia como retaliação à revolta popular no Irão.

Se bem que o protesto tenha sido desencadeado pela brutalidade policial contra as mulheres, simbolizada no célebre véu obrigatório, que os fanáticos querem fazer crer que é um mandato religioso, um ‘véu islâmico’, as palavras de ordem são contra o regime na sua integralidade, focando especialmente o guia espiritual teocrático a que todos deveriam obedecer.

O mais importante tabuleiro do confronto é agora o internacional, com o regime a usar de todos os meios de que sempre usou e abusou – reféns, promessas de paz, operações de influência, uso das secções estrangeiras dos Guardas Revolucionários Islâmicos e dos seus serviços de desinformação ou promoção de falsos opositores.

Os mais de vinte anos em que me empenhei de corpo e alma no apoio ao povo iraniano na sua luta contra a ditadura foram para mim uma grande escola de vida, mostrando-me como é fácil aos ditadores abusar do mundo democrático para comprar e manipular os nossos responsáveis, da imprensa ao sistema judicial passando pelo sistema político.

Assisti assim à teocracia que criou o que é o terrorismo moderno montar e financiar uma campanha de difamação acusando-me de ‘ser amigo de terroristas’; ao principal gang internacional de tráfico de droga que são os Guardas Revolucionários Islâmicos ser financiados pelas Nações Unidas (e pela União Europeia) pela sua luta contra o tráfico de droga; ao mais totalitário dos sistemas ideológicos do planeta ser tratado como ‘democracia islâmica’ e mais, recentemente, ao financiamento europeu à campanha misógina e racista (na verdade, islamofóbica) que visa denegrir como infiéis as mulheres muçulmanas que recusam o véu obrigatório.

E é precisamente esta última campanha que começa a ser impossível de manter e que as imagens que a custo saem do país (quem quer que seja apanhado a filmar protestos é morto a tiro ou pelo menos preso) desmontaram e se tornaram o motor da solidariedade de todos com as iranianas e os iranianos.

É por isso que vejo com uma imensa alegria as mulheres portuguesas, as responsáveis políticas portuguesas, de vários partidos e confissões, saltar na defesa das suas irmãs iranianas, e sem prejuízo de todas as outras, permito-me destacar aqui a senhora deputada Isabel Moreira, que já no passado tinha tido a coragem de enfrentar o mais conhecido dos símbolos do regime iraniano em Portugal.

É esse o espírito, a energia, e a força que é necessário manter para que o Irão seja livre e o mundo melhor.

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