Em 14 anos a Segurança Social perdeu 107879 milhões € devido à evasão e à fraude, mas o “Livro Verde para a sustentabilidade da Segurança Social” do governo anterior e a “Auditoria sobre a Segurança Social” do Tribunal de Contas ignoram e nada dizem sobre isso, e o mito criado pelos media que “os imigrantes dão lucro à Segurança Social”
Neste estudo analiso, utilizando dados oficiais cuja fonte indico, a dimensão enorme da evasão e fraude contributiva à Segurança Social (107879 milhões€ só em 14 anos) que tem impedido um reforço ainda maior da sua sustentabilidade, que os governos e Assembleia da República nada têm feito para a combater eficazmente (nunca houve um debate serio sobre esta matéria, inicialmente o 1º governo PS/Costa ainda apresentou um plano anual de recuperação das dividas à Segurança Social mas rapidamente deixou de fazer e nenhum partido se opôs): Estranhamente, a comissão nomeada pelo governo anterior no seu “Livro verde sobre a sustentabilidade da Segurança Social” e o Tribunal de Contas na sua “Auditoria feita aos relatórios de sustentabilidade da Segurança Social” ignoram completamente esta questão e não apresentam qualquer medida para a combater apesar de ser muito importante para garantir a sustentabilidade da Segurança Social.
Também analiso as enormes dividas à Segurança Social não cobradas porque os governos não disponibilizam os meios suficientes para o fazer, depois constitui imparidades, e pura e simplesmente eliminam assim as dividas (é o “apagão” de dividas de dezenas de milhões €, uma parte importante são descontos feitos nos salários dos trabalhadores que depois os patrões não entregam à segurança social) feito perante a passividade também da Assembleia da Republica que compete fiscalizar a ação do governo (entre 2024 e 2025 foram abatidas dividas no balanço consolidado da Segurança Social no montante de 10422 milhões €).
E termino desconstruindo o mito criado pela comunicação social de que “os imigrantes dão lucro à Segurança Social”, uma clara operação de manipulação da opinião publica feita consciente ou inconscientemente.
Estudo
Uma das lacunas, certamente propositadas, do “Livro Verde para a sustentabilidade da Segurança Social” elaborado por uma comissão nomeada pelo governo anterior (Ana Godinho/Costa) e surpreendentemente também da “Auditoria ao Relatório sobre a Sustentabilidade Financeira da Segurança Social” do Tribunal de Contas, ambos de dez.2024,é o facto de terem “esquecido” de analisar e propor medidas para combater a enorme evasão e fraude que a Segurança Social sofre e que a delapida todos os anos em milhares de milhões €, parte deles descontos nos salários dos trabalhadores, e que se fosse eficazmente combatida contribuiria para reforçar muito a sustentabilidade da Segurança Social. Para estas duas entidades, com critica fácil à Segurança Social, este problema, que é um dos mais graves que a Segurança Social enfrenta, é como não existisse, é um “não problema”. Mas vamos provar o contrário utilizando, a linguagem fria, mas objetiva dos números oficiais.
EM 14 ANOS ESTIMA-SE QUE A SEGURANÇA SOCIAL TENHA PERDIDO 107879 MILHÕES € DE RECEITAS SÓ DEVIDO À FRAUDE E EVASÃO O QUE FOI IGNORADO PELA COMISSÃO NOMEDADA PELO GOVERNO ANTERIOR E PELO TRIBUNAL DE CONTAS
O quadro 1 (dados oficiais do INE, Segurança Social e CGA) mostra a dimensão enorme da evasão e fraude à Segurança Social.
Quadro 1 – Contribuições e quotizações que a Segurança Social devia ter recebido e as que conseguiu cobrar devido à fraude e evasão, e receita perdida anualmente (última coluna à direita sublinhada a amarelo e com números a vermelho)
Entre 2010 e 2023, a Segurança Social, se tivesse recebido o correspondente a 11% mais 23,75% do valor dos ordenados e salários pagos no país segundo o INE perdeu 107879 milhões € de receitas, ou seja, uma perda média de 7706 milhões € por ano devido à fraude e evasão contributiva à Segurança Social. Isso não acontece em relação à CGA porque aqui o próprio empregador é público, ou seja, o Estado no sentido amplo. O gráfico 1 mostra a incapacidade que tem revelado a Segurança Social por falta de meios humanos e materiais para pelo menos reduzir esta situação que está a corroer a sustentabilidade.
Entre 2010 e 2022, a evasão e fraude contributiva somou 98494 milhões €, e a Segurança Social, devido à falta de meios humanos e materiais, e mesmo com a ajuda da Autoridade Tributária, só conseguiu recuperar 7770 milhões €, ou seja, 7,9% do que devia ter recebido. Estranhamente a comissão nomeada pelo governo anterior (Ana Godinho) e o Tribunal de Contas ignoraram completamente este grave problema que está a causar um enorme prejuízo à Segurança Social, delapidando elevado montante de receitas e corroendo a sua sustentabilidade. A pergunta que imediatamente se coloca é esta: PORQUÊ? Que interesses poderosos levaram estas duas entidades a não analisar e a não se pronunciar sobre esta questão crucial para a sustentabilidade da Segurança Social? Deixo a resposta à reflexão dos leitores para não ser acusado de querer condicionar.
A SEGURANÇA SOCIAL ELIMINOU DO SEU BALANÇO EM 2023 MAIS DE 10,4 MILHÕES DE EUROS DE DIVIDAS POR NÃO TER OS MEIOS HUMANOS E MATERIAIS PARA COBRAR ATEMPADAMENTE CAUSANDO GRAVE PREJUIZO AOS PENSIOSNISTAS ATUAIS E FUTUROS
Tal como aconteceu com o chamado “cartel das seguradoras” em que estiveram também envolvidas as seguradoras da CGD e Montepio e outras, a quem a Autoridade da Concorrência (AdC) aplicou coimas no total de 108 milhões €, também em relação ao ”cartel da banca” a AdC aplicou em 2019 a 11 bancos (CGD, BCP, Santander-Totta, BPI, Montepio, etc.), com base num processo iniciado em 2013 por violação da lei da concorrência (troca de informação entre bancos com eventuais prejuízos para os clientes de credito à habitação), coimas no total de 225 milhões €, portanto 6 anos após o inicio do processo. Os bancos recorreram e a justiça levou mais 6 anos para tomar uma decisão e quando a tomou, em fev. 2025 declarou que as infrações estavam prescritas, ilibando os bancos de qualquer pagamento. Procedimentos muito semelhantes têm-se verificado com as dividas à Segurança Social. Na Segurança Social existem duas situações que interessa diferenciar. A primeira, refere-se às entidades que não declaram nem trabalhadores nem contribuições e quotizações à Segurança Social. Neste caso a Segurança Social na maioria das vezes não as deteta porque não possui os meios necessários humanos e materiais para isso, a não ser que os próprios trabalhadores a denunciem à Segurança Social (são os conhecidos pagamentos por baixo da mesa denunciados pelos media). A segunda situação grave refere-se às empresas que fazem as declarações à Segurança Social, mas que depois não entregam os descontos feitos nos salários dos trabalhadores e as suas contribuições. Nestes casos, embora a Segurança Social registe nas suas contas essas dividas, ela depois nada faz para as cobrar por falta de meios passando o tempo e em seguida considera que é impossível as cobrar, eliminando pura e simplesmente das suas contas. O quadro 2, com dados dos Balanços da Segurança Social de 2022 (balanço elaborado pelo governo de Costa) e de 2023 (balanço elaborado pelo governo de Montenegro) mostra a dimensões destes “apagões de dividas à Segurança Social”.
Quadro 2 – Dívida declarada pelos contribuintes, mas não cobrada pela Segurança Social porque os sucessivos governos não disponibilizaram os meios humanos e materiais necessários para atuar atempadamente – em milhões de euros
Entre 2022 e 2023, do Balanço consolidado da Segurança Social desapareceram 10422 milhões € de dividas dos contribuintes (passaram de 15700 milhões € para apenas 5278 milhões €), o que significou um grave prejuízo para os reformados atuais e futuros pois se essa importância tivesse sido cobrada a situação da Segurança Social seria ainda mais sólida e os aumentos das pensões podiam ser pensões maiores. E não foi apenas culpa do governo de Montenegro. No Balanço de 2022, o governo de António Costa já tinha constituído imparidades de 10153,1 milhões € (valores a vermelho) para anular igual montante de dividas à Segurança Social, portanto só 268,9 milhões € foi decisão de Montenegro. E 3299 milhões € que foram anulados pelos governos de Costa e Montenegro eram descontos feitos nos salários dos trabalhadores, mas não entregues à Segurança Social pelos patrões. A Segurança Social embora não receba aqueles 10422 milhões €, terá de pagar as pensões correspondentes a eles porque os trabalhadores não têm culpa que o governo não tenha cobrado aquele valor. É assim que governos “destroem” a Segurança Social, e não apenas o SNS. E os partidos na Assembleia da República, que têm a responsabilidade de fiscalizar a ação do governo nada fazem para pôr cobro a esta destruição de valor, pois mantêm-se calados e passivos. Nunca marcaram debate sobre esta matéria vital para milhões de portugueses. E isto apesar de todos os anos a Segurança Social não conseguir cobrar o que devia por falta de meios e as dividas incobráveis acumulam-se.
O MITO CRIADO PELA COMUNICAÇÃO SOCIAL DE QUE OS IMIGRANTES DÃO LUCRO À SEGURANÇA SOCIAL
O Público, em dez.2023, escreveu “Imigrantes deram mais de 1600 milhões de lucro à Segurança Social”. Em 2025, no “site” da SIC Noticias pode-se ainda ler “Os imigrantes estão a entregar cada vez mais dinheiro à Segurança Social. Em 2024, contribuíram com cinco vezes mais do que aquilo que receberam, ou seja, com 3600 milhões € (deste montante apenas 1140 milhões € são descontos nos salários dos imigrantes o restante -2460milhões € – são contribuições das empresas portuguesas), e receberam 687 milhões €. Quem leia estas notícias tratada desta forma incorreta (é uma clara manipulação da opinião publica, talvez sem consciência disso) pode ficar com a ideia enganadora desses “lucros” , mas o que ela revela é ignorância sobre a Segurança Social portuguesa. Para mostrar o absurdo dela basta fazer o seguinte raciocínio: em 2024, os descontos e quotizações para a Segurança Social atingiram 27492 milhões €.
Deduzindo a parcela dos imigrantes (3600 milhões €) restam 23892 milhões €, que seria a contribuição dos trabalhadores portugueses para a Segurança Social. Se deduzirmos a este valor o que eles receberam em 2024 sob a forma de subsídios de desemprego e de doença (1724 milhões €) ficariam 22168 milhões €. Ninguém honesto, e com um mínimo de conhecimento como funciona a Segurança Social diria que a Segurança Social teve com os 4,2 milhões de trabalhadores portugueses que estão inscritos nela (segundo o Livro Verde da Segurança Social estavam inscritos nesta apenas 524 mil imigrantes, ou seja, metade dos imigrantes que estão no nosso país e 12% do total de inscritos) um “lucro” de 22168 milhões€. Seria absurdo dizer isso. Mas é o que muitos sistematicamente fazem nos media enganando a opinião pública. Tal como acontece com trabalhadores portugueses, os imigrantes que descontam para a Segurança Social estão a construir a pensão que receberão quando se reformarem, que corresponderá, em média, entre 2% e 2,3% do salário de referência por cada ano de desconto, que serão pagas pelos trabalhadores na altura no ativo. Aos que utilizam o argumento de que os imigrantes dão lucro para fraturar a sociedade portuguesa quero lembrar que os imigrantes têm direito, e bem, ao SNS, mas cada utente custa em média por ano 1600€ (1600€ X 1,2 milhões imigrantes dá 1920 milhões €), que estão em escolas públicas mais de 160000 filhos de imigrantes que têm um custo elevado (870 milhões €/ano), passes sociais suportados em parte pelo Estado , etc., etc. E criam também riqueza para o país que é necessário não ignorar. O problema não são os imigrantes, mas os serviços públicos que não foram reforçados para tantos. É importante não transformar o problema dos imigrantes numa conta de DEVE/HAVER como muitos fazem utilizando argumentos falsos e tecnicamente errados.