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Terça-feira, Dezembro 24, 2024

Selecção oficial não ultrapassou a mediania

José M. Bastos
José M. Bastos
Crítico de cinema

52.º Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary

Sendo uma das mostras mais importantes da Europa, e pertencendo à classe principal dos festivais de cinema (a mesma de Cannes, Berlim, Veneza, San Sebastián, …), Karlovy Vary, pelo menos nos anos mais recentes, tem organizado a sua secção oficial competitiva com base em filmes de realizadores pouco conhecidos ou em início de carreira e em filmografias de países pouco presentes nos ecrãs ocidentais.

Uma opção arriscada, mas talvez a possível. E, no caso concreto da edição deste ano que termina amanhã, não se pode dizer que a aposta tenha sido bem sucedida. De facto, terminada que está a exibição dos filmes em concurso poder-se-á dizer que a maioria dos títulos apresentados não ficará na nossa memória durante muito tempo. Falamos hoje dos seis filmes que constituíram a segunda metade do lote de competidores.

Breaking News

Breaking News, de Iulia Rugina

Um filme sobre a televisão dos nossos dias. Começamos por um dos mais interessantes, com as reservas anteriormente referidas: Breaking News da romena Iulia Rugina. O tema que enquadra a narrativa é de grande actualidade e motivo de ampla discussão, na Roménia, em Portugal, e na generalidade dos países: o modo actual de fazer televisão. O sensacionalismo, o objectivo de dar a notícia primeiro que a concorrência (mesmo que depois venha a ser desmentida) e ainda que isso envolva violações de privacidade, perigos para a integridade física dos repórteres e até o não cumprimento dos seus deveres deontológicos.

O filme começa com a deslocação de um jornalista e de um operador de imagem a uma fábrica em que ocorreu uma explosão. Os homens da TV conseguem chegar antes da polícia e movimentam-se com toda a liberdade. Quando começam a gravar dá-se um segundo acidente, a estrutura desaba e o homem da câmara é atingido mortalmente. A partir desse momento o objectivo do canal de televisão passa a ser outro: a exploração mediática da morte de um dos seus. O jornalista que escapou ao acidente tem agora como tarefa realizar um conjunto de entrevistas sobre o colega e fazer a cobertura do funeral. Só que se vê confrontado com a decisão de não colaboração por parte da família, e em particular da filha.

O jornalista inicia então um processo de aproximação e persuasão à jovem rapariga mas não escapa às dúvidas, deontológicas e outras,  que a sua própria consciência lhe coloca. Breaking News é um filme que demostra alguma vitalidade do cinema romeno e a sua capacidade para abordar problemas actuais que são comuns a muitas outras geografias.

The Cakemaker

The Cakemaker, de Ofir Raul Graizer

Um filme israelita pouco ortodoxo. Co-produção israelo-alemã, dirigida por Ofir Raul Graizer, The Cakemaker é a história de um pasteleiro berlinense que se apaixona por um homem israelita, casado e com um filho, que se desloca frequentemente à Alemanha em trabalho e que morre pouco tempo depois. O alemão vai então para Israel procurar a família e o passado do seu amado e acaba por estabelecer uma relação com a viúva. O filme tem como principal mérito o questionamento, em vários planos, do controlo exercido pela comunidade israelita mais ortodoxa. E fá-lo de uma forma simples e despretensiosa.

Križácek

Križácek / Little Cruasader, de Václav Kadrnka

Križácek / Little Cruasader  é um filme checo realizado por Václav Kadrnka que contou com o apoio da região italiana da Sardenha. Tal apoio é justificado pelo facto de o tema da película – um cavaleiro que procura o seu filho desaparecido –, estar ambientado numa cruzada do início do século XIII que culminou com numa tragédia numa ilha da Sardenha. Križácek / Little Cruasader é uma obra de grande rigor estético e beleza formal mas com uma narrativa pouco fluente que provocou o desinteresse e o tédio na maior parte dos espectadores. Um filme interessante mas não para a secção competitiva de um festival desta natureza. 

Keep the change

Keep the change, de Rachel Israel

A presença norte-americana. De há alguns anos a esta parte a presença norte-americana na selecção de Karlovy Varz tem vindo a ser assegurada por filmes do chamado cinema independente. Desta vez, tivemos Keep the change, realizado por Rachel Israel que conta, num registo de comédia romântica, a ligação que se estabelece entre um casal de jovens autistas que frequentam sessões de terapia de grupo. Um filme apenas simpático.

Birds Are Singing in Kigali

Birds Are Singing in Kigali, de Joanna Kos-Krauze

Uma ruandesa na Polónia. A polaca Joanna Kos-Krauze trouxe ao festival este filme co-realizado com o marido, Krzysztofy Krauze falecido em 2014. A trama tem duas histórias que se entrecruzam. A de uma ornitóloga polaca, Anna, que desenvolve trabalho no Ruanda e a de uma jovem ruandesa, Claudine, filha de um cientista daquele país, que foge para a Polónia aquando do ataque dos Hutus aos Tutsis. A vida da jovem africana na Europa, primeiro num centro de acolhimento e depois em casa de Anna, e o seu desejo, finalmente concretizado, regresso à  sua pátria africana para enterrar os seus mortos. Uma obra interessante mas que padece do mal de ser demasiado longa, não obstante a forma competente como é realizada.

Ralang Road

Ralang Road, de Karma Takapa

Um filme indiano para fechar. A exibição dos filmes em competição terminou com Rolang Road, um trabalho do indiano Karma Takapa. Numa pequena cidade de montanha dos Himalaias assistimos a uma história protagonizada por quatro indivíduos  que levam o espectador a descobrir um labiríntico microcosmos social. Uma série de eventos aparentemente desconexos acabam por relacionar-se devido a várias coincidências. Com uma narrativa pouco comum, filmado com câmara à mão, Rolang Road é um filme pouco convencional, tanto na trama como na construção, e provocou por isso uma debandada quase generalizada dos espectadores.

E pronto, resta esperar pelas decisões do júri oficial do Festival.

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