É como se tudo estivesse programado para uma vida perfeita sem problemas e sem dramas. Nem pequenos, quanto mais grandes.
Para se ser aceite – e muito bem – socialmente, tudo nas nossas vidas tem de estar bem, não se falar de problemas, sejam eles de que natureza forem, estar-se alegre e sempre de bom humor.
Se perguntamos como tudo vai, desde a família, aos filhos, à saúde, tudo está, se não muito bem, no mínimo bem. Ninguém tem problemas com o marido, com os filhos, com a amiga, com a empregada, com o vizinho. Tudo é tão perfeito na vida dos outros, que não nos atrevemos sequer a nos queixar ou a lamentar sobre o que nos aborrece ou nos entristece. E tantas coisas nos aborrecem e outras tantas nos entristecem. Quantas vezes ultimamente ouvimos alguém se queixar de que não está se sentindo bem, se queixar de alguma traição ou de que simplesmente está triste? Muito menos que esses estados se prolongam no tempo? Bom mesmo, é não transmitir nada que possa importunar os outros. Bom mesmo é ter sucesso, é ter dinheiro, é fazer a última viagem dentre todas as que programou, e ser a pessoa mais feliz. Sim, porque as expectativas de vida e o padrão de vida, esse, não pode baixar nunca, sob pena de nos sentirmos quase infelizes.
Por ser assim, se queremos estar de bem com todo o mundo e o mundo delas, sejamos alegres, não falemos nunca de dramas, de problemas, de falta de dinheiro, de angústias várias. É que desta forma, ninguém nos vai achar problemático, complicado, ou um maçador a ter de se evitar.
Exaustos de tanto nos contermos, sem podermos abrir o coração e a boca, até porque ninguém nos ouviria mesmo, não sabemos ainda as consequências de tanta contenção.
Certo é que estamos a perder o que de melhor há na vida e nos relacionamentos humanos, que é a troca de experiências, de partilha. A troca de esperanças, de ideais. De vida, em suma. Ir atrás do que na verdade interessa. E que nenhum enfeite disfarça.
Por opção do autor, este artigo respeita o AO90