Simone Weil nasceu no princípio do século XX (1909) em Paris, no seio de uma família de origem judaica. Desde muito cedo, apresentou duas características que vão marcar toda a sua vida: uma notável inteligência e uma grande preocupação com todos os que sofrem. Conheceu, em profundidade, a filosofia e a cultura grega e, aos 22 anos realizou o exame de Agregação em Filosofia na Escola Normal Superior, tornando-se, posteriormente, professora. Foi militante operária, filósofa e escritora, e, apesar da sua formação agnóstica, foi, também, protagonista de uma intensa vivência religiosa.
Inconformista por natureza
Inconformista por natureza, procurou não só pensar e teorizar sobre a vida dos operários e sobre as condições de opressão em que vivia o proletariado na primeira metade do século XX, mas também viver essa vida para melhor a entender. A fome, o cansaço, a angústia do desemprego e todas as situações de desumanidade foram por ela experienciadas.
Com o objectivo de compreender melhor todos os mecanismos inerentes ao modo de produção capitalista trabalhou em fábricas, por exemplo, na linha de montagem da Renault, até que as suas forças físicas lho permitiram (1935). Mal recuperada da exaustão física a que tinha chegado, no ano seguinte ingressou nas forças republicanas que combatiam o franquismo na Guerra Civil Espanhola.
Mais uma vez a fragilidade física impediu-a de prolongar essa participação por muito tempo e, como consequência das atrocidades de que tinha sido testemunha, reforçou as suas convicções pacifistas. Contudo, isso não a impossibilitou de voltar à luta, agora integrando a resistência francesa aos nazis, em Londres.
Como consequência da sua debilidade física e das situações que experienciava, o seu estado de saúde foi-se deteriorando progressivamente e acabou por falecer em 1943 com 34 anos de idade. Simone Weil foi o exemplo vivido de um filosofar que se alimenta de tudo o que é vida, de tudo aquilo que constitui o quotidiano. Como refere Robert Chenavier, um reconhecido especialista no pensamento desta filósofa: Em Simone Weil, a vida, a personalidade, o engajamento e a reflexão formam um todo, num grau excepcional”[1]
O ser humano precisa de ter múltiplas raízes
Apesar de ter falecido bastante jovem deixou um testemunho de vida e uma vasta obra que abarca, por um lado, as suas preocupações com o movimento operário “A condição operária e outros escritos sobre a opressão” e, por outro lado, inquietações de ordem metafísica “Espera de Deus”. É a criadora do conceito de “enraizamento” e a sua última obra, com o mesmo título, foi publicada em Portugal pela Relógio d’ Água, em 2014.
Segundo a perspectiva da filósofa, o ser humano precisa de ter múltiplas raízes, que decorrem da participação real, activa, numa determinada comunidade, que tem uma história (memória) e um horizonte de futuro (projectos). É este enraizamento que se constitui como a “necessidade mais importante e mais conhecida da alma humana”. Para além desta participação no espaço cultural, os seres humanos precisam, igualmente, de estar enraizados no espaço natural, geográfico. É de uma totalidade que a filósofa fala: nascimento, casa, vizinhança, trabalho, cidade.
Ora acontece que o desenvolvimento técnico da modernidade e as suas consequências, assim como as condições de vida no mundo operário, conduzem a uma situação oposta, o desenraizamento. O trabalho fabril afasta cada um de si e dos outros, da comunidade e da memória social, prevalecendo um conjunto de experiências marcadas pelo isolamento.
Simone Weil, injustamente esquecida
Na História da Filosofia verifica-se o mesmo que em muitas outras Histórias: há personalidades que são injustamente esquecidas. É o caso de Simone Weil. Não obstante, o seu pensamento continua a ser um instrumento muito útil para a reflexão sobre alguns dos problemas da contemporâneidade, nomeadamente os que se referem à técnica e aos seus efeitos, ao trabalho e às novas condições desumanizantes em que se processa e ao modo como nos desenraizamos da Terra (questões ecológicas).
Num mundo onde as pessoas se sentem, de facto, “desenraizadas”, ler, de novo, Simone Weil e pensar sobre o seu exemplo de vida, poderá ser inspirador para novos caminhos.
[1] Chenavier, R, Simone Weil : L’attention au réel. Paris, Michalon, 2009, p. 13