Nos primeiros seis meses de mandato o Presidente Marcelo falou sobre tudo e a toda a hora. Alguns criticam-no por falar tanto e há quem ache que fala demais: ultrapassa os poderes presidenciais, opina como se fosse ainda um comentador, extravasa os poderes constitucionais, intromete-se na acção do governo, dizem.
Tudo isto é verdade e Marcelo sabe-o bem. Porque o faz então?
Tentemos uma explicação: Marcelo sabe melhor que ninguém como funciona o jornalismo. Sabe que os jornalistas se alimentam de declarações e que precisam de vozes para manterem o fluxo noticioso. Marcelo sabe como se forma e se influencia a opinião pública e conhece o povo que tem pela frente. Marcelo é, como sempre foi, o melhor spin-doctor da política portuguesa.
Nos seis meses que leva de mandato, Marcelo não falhou uma: avisou, comentou, elogiou, criticou, aprovou, nada lhe escapou. Esteve sempre à frente marcando a agenda política e mediática, orientando a discussão e influenciando o tom do debate público sobre os principais assuntos que marcam a vida do País.
A selecção nacional ganhou o Europeu? Marcelo dá festa e medalhas aos jogadores. A Europa ameaça Portugal com sanções? Marcelo desvaloriza e acalma o povo político. Filhos do embaixador do Iraque espancam um jovem em Ponte de Sôr? Marcelo mostra-se chocado e faz saber que telefonou à família da vítima. Os fogos florestais devastam o País? Marcelo lá está para consolar os desalojados e avisar que vai estar atento. Comandos do exército morrem em exercícios? Marcelo conforta famílias, visita os feridos e apoia a suspensão dos cursos. Marcelo tudo explica, tudo comenta e a todos aconselha…Marcelo está em todas!
Marcelo não espera que pensemos por nós próprios. Ele pensa por todos nós e adianta-se a dizer-nos como devemos pensar sobre tudo o que de importante acontece no País. Chama-se a isto fazer spin. Até agora, o spin do Presidente tem ajudado o governo.
António Costa percebeu isso muito bem e não o incomoda que o Presidente se meta nos assuntos da governação. É certo que o spin do Presidente lhe traz popularidade, como mostram as sondagens. E também é certo que António Costa é o melhor “parceiro” que Marcelo podia ter encontrado. Não há competição entre ambos, há, sim, concertação e compreensão dos respectivos papéis.
Se a presente concertação vier a dar para o “torto” será mais difícil ao Presidente demarcar-se de Costa do que a este demarcar-se de Marcelo, já que se algum se meteu no campo do outro, foi Marcelo e não Costa.
Artigo publicado inicialmente no blog VAI E VEM