O Projecto Tornado surgiu de forma singular e muito bonita. A ideia foi formulada por um pivô em resultado das manifestações de muitos jornalistas, e outros profissionais da comunicação, num grupo de Jornalistas do Facebook.
Em síntese, é possível identificar o conjunto de princípios e valores, rejeitados e defendidos, por um grupo de pessoas que reunia todas as competências para lançar um projecto associativo, empresarial e Jornalístico, apto a bater-se com os grandes grupos privados existentes, e dominantes, no mercado nacional de Comunicação Social. A saber:
Todos rejeitavam
- Falta de liberdade nas Redacções;
- Falta de diversidade na Informação, afunilada em painéis de Opinião onde pontuavam sobretudo os Comentadores da direita neoliberal e os arautos da austeridade;
- Políticas de Recursos Humanos baseadas na exclusão dos Jornalistas mais experientes, mais caros e menos manobráveis, substituindo-os por Estagiários, grátis, tratados como coisas “fungíveis”, com prazo de validade;
- Multiplicação das situações de precariedade, geradora da insegurança necessária às intromissões de outros interesses nas Redacções;
- Política de baixos salários;
- Exigências de produtividade incompatíveis com a deontologia e a qualidade mínima exigível;
- Progressiva perda da dignidade, pessoal e profissional, dos intervenientes no processo de produção da notícia, suprimindo funções especializadas, amalgamando outras, o que conduziu inexoravelmente à descaracterização editorial;
- Clonagem de projectos editoriais aparentemente bem sucedidos em termos de audiências, etc.. Ou seja, nivelar diferentes produtos por baixo, tratando os “consumidores” – leitores, espectadores, ouvintes, utilizadores – como estúpidos ou a estupidificar.
Todos concordavam
- Necessidade de criar um projecto alternativo para combater os diversos aspectos elencados acima;
- Urgência de suprir a lacuna de uma publicação editorialmente controlada pelos jornalistas, que apresentasse os pontos de vista ausentes na generalidade dos Órgãos de Comunicação Social (OCS) e outras leituras e ideias sobre a realidade contemporânea confinados a Blogs e às Redes Sociais;
- Criar oportunidades e emprego para aqueles que, tendo valor e espinha dorsal, se encontravam sem trabalho em consequência da sua dissonância com a Doutrina dominante nos OCS mainstream, por razões economicistas e tecnocráticas, paridas em folhas de cálculo de Executivos oriundos de outros mercados e que de jornalismo ou edição nada entendiam;
- Garantir estabilidade profissional e rendimento digno, de acordo com a disponibilidade e prestação individual de cada um;
- Recorrer a uma fórmula de “empresa” que colocasse todos em pé de igualdade no que concerne à propriedade do Capital e a opção por um modelo “não lucrativo”;
- Não obstante o definido no ponto anterior aceitar que o “modelo de gestão” seria profissional, com funções definidas, algumas electivas. De comum, a possibilidade de “remoção” dos titulares das funções caso não as exercessem de modo satisfatório;
- Assumir à partida a orientação de esquerda, das esquerdas, de todas as esquerdas, como referência política. De esquerda quer dizer, neste contexto, defensores da Declaração Universal dos Direitos Humanos, defensores do Estado de Direito e do Estado Social ou Providência, dos valores culturais da História e Civilização Europeias, da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, de não deixar ninguém para trás, da defesa do Ensino Universal, da Saúde Universal e de Políticas Sociais dignas para todos. Nada mais;
- A ninguém foi perguntada qual a orientação partidária, religiosa, etc. desde que todas as formas de exclusão e segregação estivessem excluídas: Racismo, Xenofobia, Homofobia, Sexismo, Machismo e quejandos ficariam à porta;
- Uma vez que ninguém tinha capital o montante das quotas de cada sócio seria realizado em trabalho e não em dinheiro. Cada “candidato” a Sócio tinha apenas de depositar um montante simbólico de 50€, símbolo do seu compromisso e interesse no Projecto, a que se convencionou chamar “Jóia” e era irreversível.
O investimento em “Trabalho” permitiria criar uma “bolsa de tempo” e, com ela, a implementação da estrutura empresarial indispensável à concretização do Projecto, faseado, com um calendário regressivo e um plano de trabalho e de lançamentos.
Desde o primeiro momento ficou claro que o Jornal generalista, ainda sem nome à época, seria sempre deficitário e suportado por um modelo de negócio baseado em produtos de “nicho”. A intervenção cultural, o âmbito nacional, baseado na presença em cada região, e o facto de ser dirigido a toda a Lusofonia – PALOP e diáspora – seriam elementos diferenciadores e ao mesmo tempo fontes potenciais de receitas.
Este foi o Projecto inicial, submetido a uma assembleia de cerca de 60 pessoas que a ele deram o seu acordo de forma expressa. E um embrião de Comissão Instaladora deu os passos iniciais.
Foi assim que tudo começou.
Não deixe de ler o próximo artigo onde irei esmiuçar alguns incidentes de percurso e as primeiras dissidências.