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Terça-feira, Novembro 5, 2024

Troika agravou desigualdade na repartição da riqueza

A desigualdade na repartição da riqueza criada entre o Trabalho e o Capital agravou-se muito em Portugal durante a crise. Esta é a principal conclusão do economista Eugénio Rosa, que analisou as desigualdades salariais existentes no País – as mais elevadas entre os países da União Europeia.

Segundo um relatório recente da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Portugal é o país da União Europeia onde a diferença entre o grupo dos 10% com salários mais elevados e o grupo dos 10% com salários mais baixos é maior (cinco vezes superior, sendo a média europeia 3,5 vezes).

Eugénio Rosa adianta que se a comparação for feita entre o grupo 1% com salários mais elevados e o grupo dos 10% com salários mais baixos a diferença aumenta já para 12 vezes. “E se a comparação for feita com os administradores a diferença é abissal”, verifica o economista, no seu último estudo, ao assegurar:

É uma desigualdade que vem de trás, e que as políticas de austeridade agravaram brutalmente, aliás, é essa uma das suas finalidades”.

Exemplifica com o seguinte caso: em 2016, António Mexia, presidente executivo da EDP, recebeu, como remuneração (fixa e variável) mais de dois milhões de euros, conforme divulgaram os órgãos de informação. Este valor dá uma média de cerca de 145 mil euros por mês (14 meses), o que corresponde, por dia, a quase cinco mil euros. “Certamente duas ou três vezes superior ao que recebe por mês a maioria dos trabalhadores da EDP”.

Infelizmente, mesmo a política do actual governo não vai no sentido de corrigir estas graves desigualdades, até as incentiva, dando benefícios (redução da TSU) às empresas que pagam apenas o salário mínimo”

Lamenta.

“Trabalhadores penalizados”

Com base em dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatísticas (INE), o economista analisa ainda a desigualdade na repartição da riqueza criada anualmente em Portugal entre o Trabalho e o Capital no período 1995-2016 que, segundo o estudo, se agravou com a crise e, nomeadamente, “com a política de austeridade do governo PSD/CDS  e da ‘troika’, tendo-se registado uma pequena inversão nesta tendência no ano de 2016.

A contradição fundamental em qualquer sociedade capitalista é a que existe entre o Capital, aqui entendido como os proprietários dos meios indispensáveis à produção quer de bens e serviços, e o Trabalho, aqui constituído pelos trabalhadores que têm de vender a sua força de trabalho para obterem um salário para que eles e as suas famílias possam viver/sobreviver”

Afirma o doutorado pelo ISEG.

Assim, socorrendo-se dos dados do INE, Eugénio Rosa revela que os trabalhadores foram os mais penalizados durante a crise, “enquanto os patrões até foram beneficiados porque viram aumentar a parcela percentual da riqueza criada anualmente no País de que se apropriam”.

Eugénio Rosa revela que os trabalhadores foram os mais penalizados durante a crise, “enquanto os patrões até foram beneficiados porque viram aumentar a parcela percentual da riqueza criada anualmente no País de que se apropriam”

Como mostra o gráfico, “se a análise for feita em relação ao período do governo PSD/CDS e da ‘troika’ a conclusão que se tira é a seguinte: Entre 2010 e 2015, a parte dos salários e ordenados no PIB diminuiu de 36,8% para 34,1%, enquanto a parte do Excedente Bruto de Exploração, que reverte para os patrões, subiu de 41,2% para 43%”, conclui o economista.

Gráfico – Repartição da riqueza criada (PIB) entre o TRABALHO (linha a vermelho) e o CAPITAL (azul)

Por fim, Eugénio Rosa defende que a experiência histórica portuguesa “tem mostrado que o meio mais eficaz, e único, em países como o nosso, de conseguir uma repartição primária do rendimento mais justa, que é essencial, é através da contratação colectiva e do fortalecimento da capacidade de negociação dos sindicatos”.

Nos países onde os governos do patronato ou que cedem à pressão dos patrões criam obstáculos legais à contratação colectiva, as desigualdades na repartição da riqueza criada anualmente agravam-se”, acrescenta.

Eugénio Rosa conclui que em Portugal existem obstáculos importantes no Código de Trabalho que o actual governo “se tem recusado em alterar” e que dificultam tanto “a contratação colectiva como facilitam o boicote dos patrões”.

Recorde-se que o memorando de entendimento português com a Comissão Europeia, o BCE e o FMI tem data de 17 de Maio de 2011. Há seis anos, a 6 de abril, o então ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, revelava que Portugal pedira o resgate financeiro. No mês seguinte, o programa foi aprovado pelos ministros das Finanças da zona euro e acordada a primeira tranche de um apoio total de 78 mil milhões de euros. Foram três anos de troika em Portugal. O pedido foi feito durante o Executivo de Sócrates, mas foi a coligação de Passos Coelho que dirigiu as negociações e o país durante a intervenção.

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