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Domingo, Novembro 24, 2024

Uma companhia a não perder

José Carlos S. de Almeida
José Carlos S. de Almeida
Professor de Filosofia do ensino secundário. Licenciado em Filosofia e em Direito.

peregrinoUma das regras de construção do thriller, e nomeadamente dos romances de espionagem, é o seu caráter polifónico, o aparente desconcerto inicial duma narrativa que se desdobra em várias narrativas relativas a lugares e a tempos distintos, motivadas por acontecimentos aparentemente sem ligação entre si. Este esquema de construção do suspense surge em muitos romances e romancistas do género. O desconcerto e a perplexidade do leitor nos primeiros capítulos acabarão por se resolver e o infinito prazer da leitura surge quando afinal tudo se liga, quando percebemos que o bater de asas duma borboleta em Tóquio pode desencadear uma tempestade na Califórnia. Afinal, anda tudo ligado e deslindar um problema ou um mistério é, afinal, ligar as pontas soltas, descobrir a estrutura invisível que tudo liga. Sim, porque já Heraclito, num dos seus obscuros aforismos, nos dizia que tudo estava ligado e conhecimento consistia em descobrir o logos presente em todas as coisas. No thriller assistimos, precisamente, a esse desacerto inicial a que corresponderá uma série de acontecimentos terríveis até que se descobre o sentido de tudo aquilo, a razão de ser (o logos) dos acontecimentos, aparentemente desconexos.

Talvez resida aí o prazer que se obtém ao ler romances policiais e de espionagem. E este Peregrino de Terry Hayes, apesar de romance de estreia, constitui uma agradabilíssima experiência de leitura, com os condimentos certos do género: uma jovem mulher encontrada assassinada num quarto de hotel em Manhattan, um zoólogo decapitado na Arábia Saudita, restos humanos que ardem em fogo lento numa montanha algures no Afeganistão. E um investigador, o Peregrino, cujo percurso nos serviços secretos nos desperta uma progressiva aproximação. Tudo isto servido através duma escrita poderosa e muito sugestiva, ou não tivesse o autor, Terry Hayes, escrito com George Miller os argumentos de Mad Max 2: o Guerreiro da Estrada e Mad Max 3: Além da Cúpula do Trovão. Aproveitando este tempo ainda indeciso que nos obriga a ficar em casa para além do que é habitual, o Peregrino será, pois, uma excelente companhia.

 

Terry Hayes, Peregrino, Topseller, 655 pp.

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