Este é realmente um momento marcante e histórico no combate à pandemia de Covid-19. É a primeira vacina aprovada contra a Covid-19 e a primeira vacina com plataforma de RNA mensageiro (mRNA) aprovada no mundo!
O Reino Unido, reconhecendo que a BNT162b2, a vacina da Pfizer/BioNTech, atende aos rígidos níveis de segurança, qualidade e eficácia, é o primeiro país a autorizar o uso da vacina, que começa a ser administrada em todo o país já na próxima semana. A vacina precisa de duas doses em intervalo de 21 dias.
Este é realmente um momento marcante e histórico no combate à pandemia de Covid-19. É a primeira vacina aprovada contra a Covid-19 e a primeira vacina com plataforma de RNA mensageiro (mRNA) aprovada no mundo!
Esse momento pode ser considerado uma revolução na história das imunizações, uma plataforma que pode significar o futuro, caso essas vacinas de mRNA se mostrem tão eficazes quanto as análises preliminares interinas estão indicando!
O que há de revolucionário na vacina mRNA
A vacina funciona assim, o RNA mensageiro, um produto químico sintético produzido em laboratório, possui informações da proteína S (proteína Spike ou espícula) do vírus SARS-CoV-2, responsável por interagir com a enzima ECA-2 (enzima conversora da angiotensina 2), uma proteína presente nas nossas células, servindo como porta de entrada do vírus em nossas células. O mRNA ou a sequência do RNA sintético é introduzido em uma nanopartícula lipídica (uma capa protetora de gordura) e ao ser injetado em nosso organismo, entra nas nossas células, que vão ler e interpretar as instruções que fazem parte das moléculas de mRNA para produzir outra proteína, que é uma cópia de parte da proteína Spike do vírus.
É como se um pedacinho do SARS-CoV-2 fosse gerado pelo nosso organismo. Neste momento, o nosso sistema imunológico, que está sendo enganado pela tecnologia, identifica essa cópia de parte da proteína Spike do vírus como um corpo estranho (um patógeno), entende que é uma ameaça que precisa ser combatida e começa a produzir anticorpos para neutralizar a cópia da proteína Spike (nesse momento tem início a resposta imunológica). A produção de proteínas Spike pelo nosso organismo tem que ser suficiente para induzir uma resposta imunológica robusta, de anticorpos neutralizantes e, eventualmente, de células de memória (células TCD4 e TCD8). Aí, quando nós tivermos contato com o vírus real, selvagem, que possui na sua camada externa a proteína S (Spike ou espícula) real, nosso organismo já estará preparado para produzir anticorpos para neutralizar o vírus real. Fascinante!
Esta é uma plataforma vacinal segura e rápida para produzir vacinas em larga escala, embora seja uma tecnologia mais cara que as baseadas em vetores virais, seja com vírus atenuados ou vírus inativados. Nós poderemos, no futuro, usar a mesma tecnologia, mas com fragmentos de mRNA diferentes, com informações genéticas de outros vírus e usar para produzir resposta imunológica a esses outros vírus, ajudando a nos proteger de doenças potencialmente perigosas.
O mRNA não modifica nosso DNA, não altera nosso genoma, não altera o nosso código genético, não se preocupe, pois ele não entra no núcleo, onde está o DNA humano. O mRNA é usado em quantidades muito pequenas e como é uma molécula frágil, permanece algumas horas dentro das células, é degradado e não apresenta nenhuma toxicidade, sendo eliminado naturalmente do organismo.
É fantástico que a plataforma de mRNA de certa forma reproduz o processo de infecção viral real. Nem mesmo o vírus SARS-CoV-2, real, que causa a Covid-19, quando entra nas nossas células, não afeta o nosso DNA, o nosso material genético, pois ele não entra no núcleo, mas ele usa a maquinaria celular para se multiplicar fazendo cópias dele mesmo.
No caso da vacina a base de mRNA, não há informações suficientes ou instruções para a multiplicação da camada lipídica de gordura introduzida, apenas da sua proteína externa, que tem informações da proteína Spike, aqueles espinhos que parecem em qualquer figura do SARS-CoV-2. Então ninguém vai produzir o vírus, vai produzir apenas parte da proteína externa dele. Essa fragilidade do mRNA, que pode ser degradado pelo próprio sistema imunológico e no início levantou dúvidas quanto a sua eficácia em produzir resposta imunológica robusta, traz questões logísticas importantes, pois a vacina precisa ser mantida em temperaturas entre -20 e -70 graus Celsius.
Um dos desafios é preparar plataformas vacinais a base de mRNA mais estáveis termicamente, mais estabilizadas e que possam ser armazenadas sem degradação, em temperaturas na faixa de 2 a 8 graus Celsius. Estas vacinas, inclusive, nem precisam de adjuvantes para ajudar na indução de resposta imune e aparentemente produzem poucas reações adversas. As empresas Pfizer/BionTech já apresentaram uma autorização de uso de urgência à FDA (agência reguladora de medicamentos dos Estados Unidos).
A candidata vacinal da Pfizer/BionTech apresenta eficácia de 95%, quando aplicada em duas doses, segundo os resultados preliminares após a primeira análise interina. Esta vacina precisa ser armazenada a -70 graus Celsius, será entregue em recipientes especiais que podem manter a temperatura por até 5 dias a -70 graus Celsius com o uso de gelo seco. Essa vacina tem estabilidade por um período de apenas 5 dias em geladeiras comuns, mas em princípio, não será distribuída para a população brasileira, segundo comunicado do Ministério da Saúde, que alegou que, para ser incorporada ao PNI, a vacina deve ser “fundamentalmente” termoestável por longos períodos, em temperaturas de 2 a 8 graus Celsius.
A nossa rede de frios, com cerca de 34 mil salas, é montada e estabelecida apenas para esse intervalo de temperaturas. O futuro bate à nossa porta, precisamos nos adaptar. Aqui cabe a primeira frase na letra da música “Não vou me adaptar”, de Nando Reis e Arnaldo Antunes: Eu não caibo mais nas roupas que eu cabia.
Ministério da Saúde adverte: vacina não será para todos em 2021
Segundo o Ministério da Saúde, que está elaborando um plano nacional preliminar de imunização, uma vacina aprovada contra a Covid-19 não deverá ser oferecida para toda a população brasileira em 2021, mas apenas para grupos de maior risco de exposição e complicações pela doença, começando com profissionais de saúde (~3,5 milhões), maiores de 75 anos (~8,1 milhões) e indígenas (~800 mil). Pessoas com mais de 60 anos vivendo em asilos ou instituições psiquiátricas (~300 mil) poderão ser incorporados na primeira fase, que prevê a imunização de cerca de 13 milhões de brasileiros, ou ~6% da população.
A ideia é iniciar uma campanha de vacinação de grupos com maior prioridade, englobando idosos, pessoas com doenças crônicas e profissionais de saúde, considerando o cenário epidemiológico no País. A campanha está prevista para iniciar entre março e junho de 2021, caso tenhamos vacina aprovada em fase 3, registrada pela Anvisa e disponível. O plano foi dividido em 4 etapas e pretende atingir 109,5 milhões de pessoas, ou 51,5% da população brasileira, estimada em 212,4 milhões, segundo o IBGE. Para isso precisaremos de 219 milhões de doses, considerando a necessidade de duas doses. Lembramos que crianças e gestantes não fazem parte de estudos clínicos de fase 3.
A segunda fase prevê a vacinação de pessoas entre 60 a 74 anos (~22,1 milhões), a terceira etapa prevê a imunização de pessoas com comorbidades que apresentam maior risco de agravamento da doença (não há estimativa de quantidade). A última etapa prevê a inclusão de professores, agentes de forças de segurança, proteção e salvamento, funcionários do sistema prisional e a população carcerária.
Estas etapas consideram dados do próprio Ministério, que mostram que a faixa etária entre 60 e 79 anos concentrou a maior taxa de mortes por Covid-19 (46,9%), enquanto idosos com 80 anos ou mais tiveram taxa de morte na faixa de 22,3%.
Com os acordos assinados até o momento com a farmacêutica AstraZeneca (vacina de Oxford, 100,4 milhões de doses) e com a Covax Facility, consórcio criado pela OMS para acelerar o desenvolvimento e distribuição das primeiras vacinas eficazes contra a Covid-19 (mais 42 milhões de doses), lembrando que serão necessárias duas doses, seria possível vacinar cerca de 71,2 milhões de brasileiros até meados de 2021.
Como existe a previsão de que a Fiocruz possa produzir mais 110 milhões de doses da vacina de Oxford ainda em 2021, seria possível imunizar mais 55 milhões de pessoas (sem considerar o efeito da meia dose), totalizando 126,2 milhões de brasileiros imunizados, ou 59,4% da população. O Ministério prevê a chegada das primeiras 15 milhões de doses da vacina nos dois primeiros meses de 2021, totalizando 100,4 milhões de doses até o meio do ano.
A CoronaVac, alvo de uma disputa política lamentável entre o presidente Jair Bolsonaro e o governador João Doria, não está sendo considerada neste plano inicial para distribuição nacional. O governo do estado de São Paulo, por meio do Instituto Butantan, possui acordo com a Sinovac para produzir mais 46 milhões de doses, sendo que 6 milhões de doses devem chegar ao Brasil até o dia 30/12 e 40 milhões seriam preparadas e envasadas no Brasil pelo Butantan em 2021.
Com essa quantidade, seria possível imunizar mais 23 milhões de brasileiros até a metade de 2021. Aí, se contarmos os 126,2 milhões de brasileiros imunizados com a vacina de Oxford + a proveniente da Covax Facility, com a CoronaVac, teremos 149,2 milhões de brasileiros imunizados, ou 70,2% da população brasileira. Se vamos atingir uma imunidade coletiva vai depender da efetividade real de cada vacina em proteger as pessoas.
A estimativa é fazer uma campanha de distribuição das vacinas em todo o país, seguindo o protocolo logístico do Plano Nacional de Imunizações (PNI), com larga experiência em campanhas de vacinação em massa e reconhecido mundialmente, mas áreas que estejam sofrendo um surto da doença podem ser priorizadas. Mas não podemos esquecer que ainda não conhecemos a duração da proteção, só saberemos depois da vacinação, se a imunidade das vacinas é devido à produção de anticorpos neutralizantes ou por células de defesa de memória, se a vacina impede a entrada do vírus no organismo, se protege contra os sintomas da doença, e nem se as pessoas que já foram infectadas com a Covid-19 precisam ou não se vacinar.
Então, poderá haver mudanças neste plano, pois ainda nem sabemos se estas candidatas vacinais serão boas para proteger idosos.
O Ministério também frisou, como já mencionado, que as vacinas para serem incorporadas neste plano devem “fundamentalmente ser termoestáveis e poder ser armazenadas em temperaturas de 2 a 8 graus Celsius. Esta afirmação descarta as candidatas vacinais da Pfizer/BioNTech e da Moderna, que precisam de cadeia de frio de -70 e de -20 graus Celsius, respectivamente, para armazenamento.
Como se consegue vacinas contra covid-19 tão rápido?
Em uma entrevista divulgada no dia 02/12/2020, eu expliquei para o programa DIRETO NA FONTE, da TV Unicamp, por que as vacinas para a Covid-19 tiveram um desenvolvimento tão acelerado.
Para complementar essas informações, é necessário colocar que o processo de desenvolvimento de vacinas está acelerado, não estamos pulando etapas, mas também é fato que nós não teremos todas as informações importantes, mesmo com essa rapidez. A aprovação para o uso emergencial das vacinas é uma situação pouco comum, será aceita neste momento por causa da pandemia, mas precisa muita cautela com a avaliação da segurança.
A efetividade (eficácia real) da vacina, será observada apenas após a aplicação em massa na população em geral, quando vamos poder considerar fatores genéticos, sociais, que retratam a diversidade de nossa sociedade, das diversas características, as minorias raciais e étnicas, crianças, adolescentes, idosos, pessoas com doenças crônicas, com deficiência de imunidade. Isso tudo não foi possível incluir nas fases 3 em andamento para as candidatas vacinais sendo testadas.
A diversidade é fundamental para garantir a generalização dos resultados. Só um tempo maior, pós-vacinação, nos dirá como a vacina se comporta para proteger uma população mais heterogênea do que aquela investigada nas diferentes fases 3 das diferentes plataformas vacinais. É muito importante salientar que a eficácia de uma vacina também não é igual em todas as populações e diferenças genéticas entre etnias na população podem levar a respostas imunes diferentes, por exemplo, considerando os povos indígenas.
A população brasileira pode confiar que as vacinas não serão injetadas em milhões de pessoas sem estabelecer se realmente protegem e se são suficientemente seguras para uso em campanhas de vacinação em massa.
A Anvisa estuda autorizar uso emergencial de vacina contra Covid-19 sem necessidade de registro, enquanto os laboratórios seguem com os estudos de fase 3, desde que seja possível garantir a segurança sem que os estudos tenham sido finalizados. Eu tenho certeza de que o grande legado científico da pandemia da Covid-19 será a produção de vacinas.
Principais candidatas vacinais: atualização
Vacina de oxford
Após a divulgação dos resultados preliminares no último dia 23/11, que a ChAdOx1 apresentava eficácia média de 70%, os desenvolvedores da candidata vacinal de Oxford receberam críticas pela falta de transparência. Segundo a Oxford/AstraZeneca, após a primeira análise interina dos testes clínicos de fase 3 realizados no Reino Unido e no Brasil, com 131 voluntários infectados, a combinação da meia dose (aplicada a voluntários até 55 anos de idade) seguida de uma dose completa depois de 30 dias, teve eficácia de 90%, enquanto a aplicação de duas doses completas levou a uma eficácia de apenas 62%.
O próprio governo britânico solicitou, no dia 27/11/2020, que a Autoridade de Regulamentação Sanitária de Medicamentos (MHRA) examinasse de forma independente a candidata vacinal de Oxford/AstraZeneca com o objetivo de determinar se atende às normas de segurança, eficácia e qualidade. A farmacêutica AstraZeneca já confirmou que a ChAdOx1 vai passar por novo estudo para reavaliar a eficácia na aplicação de meia dose, seguida de uma dose completa.
Apesar desta confusão, a candidata de Oxford/AstraZeneca tem algumas vantagens, como o preço, pois ela é mais barata e mais rápida para fabricar, pode ser armazenada em temperaturas na faixa de 2 a 8 graus Celsius. O Brasil assinou um acordo que garante a produção de doses aqui pelo Instituto Bio-Manguinhos da Fiocruz e a taxa de eficácia, mesmo considerando cerca de 70%, está acima do previsto e aceito pela OMS.
A Câmara dos Deputados aprovou no dia 02/12/2020, uma Medida Provisória que libera R$ 1.994.960.005,00 para a compra e o processamento final, formulação, envase, rotulagem e embalagem da vacina de Oxford pela Fiocruz (~R$ 1,3 bilhão para a AstraZeneca, ~R$ 95,6 milhões para a produção pela Fiocruz, ~R$ 522,1 milhões para o processamento final da vacina por Bio-Manguinhos).
Vacina da Moderna
A Moderna, que tem nas três últimas letras do nome da empresa a sigla RNA, que sintetiza sua ideia de criar medicamentos e vacinas a partir do RNA mensageiro, uma molécula que carrega instruções genéticas, anunciou em nota de imprensa que a eficácia de sua candidata vacinal supera 94% na proteção contra casos graves de Covid-19. Estes resultados são baseados na análise interina do ensaio clínico de fase 3 que envolve cerca de 30 mil voluntários, sendo que não foram observados efeitos adversos graves nos vacinados, após dois meses de avaliação e acompanhamento.
A Moderna dividiu o estudo em dois grupos, um que recebeu duas doses da candidata vacinal, sendo a segunda dose aplicada 30 dias após a primeira dose e outro grupo que recebeu duas doses de uma solução salina como placebo. Ao abrir o estudo para a análise preliminar com 196 eventos, ou 196 voluntários infectados com Covid-19, os pesquisadores confirmaram que 185 voluntários infectados estavam no grupo placebo, que não recebeu a candidata vacinal.
Outra informação importante é que todos os 30 casos graves de Covid-19 (incluído um óbito), foram observados em voluntários do grupo que tomou o placebo. Segundo a nota, a alta taxa de eficácia se manteve em todos os grupos de faixa etária, raças, etnias e entre homens e mulheres. A Moderna solicitou, no dia 01/12, autorização de comercialização condicional à Agência Europeia de Medicamentos (EMA) e vai solicitar autorização para um uso emergencial à FDA (agência reguladora de medicamentos dos Estados Unidos).
Sputinik V
A Sputnik V, que segundo a Rússia apresenta mais de 92% de eficácia, foi registrada para uso emergencial em agosto e será aplicada já na próxima semana em campanhas de vacinação em massa na Rússia, por ordem do presidente Vladimir Putin. A vacina será gratuita e terá caráter voluntário, começando com médicos e os professores. A fase 3 ainda não foi concluída, tampouco os resultados preliminares de eficácia foram publicados em revistas científicas e avaliados por outros cientistas.
O número de casos de covid-19 aumenta a cada dia
Não importa se chamam de segunda onda ou repique. Fato é que o relaxamento nas medidas não farmacológicas de combate a Covid-19, como isolamento social, distanciamento físico e o uso de máscara tem levado a aumento no número de casos no Brasil, que vê o número de mortos pela Covid-19 se aproximar dos 175 mil. Como ninguém mais aguenta ficar em casa na quarentena mais longa do mundo, as pessoas estão saindo mais de casa, aglomerando em locais públicos, fazendo festas em casa, estão abandonando o uso de máscaras, disseminado o vírus em eventos super propagadores, levando a aumento no número de casos e consequentemente, de internações.
Segundo dados divulgados pelo Imperial College de Londres, o Brasil registrou taxa de contágio e transmissão (rt) da covid-19 passando de 1,30 registrado no dia 24/11/2020, para 1,02, divulgado no dia 01/12/2020. Isso indica que um grupo de 100 pessoas infectadas com o Sars-CoV-2 pode transmitir o vírus para outras 102 pessoas. Não podemos ignorar o vírus, pois ele continua circulando firme.
Nós não temos vacina contra a ignorância, contra o vírus que causa o negacionismo científico, nós precisamos que a ciência assuma o comando, não os políticos, pois por enquanto o vírus está no comando. As pessoas têm uma noção equivocada que o vírus está menos infeccioso, não está tão letal e está matando menos, que como os médicos e intensivistas aprenderam a lidar com a doença e com os casos mais graves, existem alternativas terapêuticas para o tratamento. Vem aí um período bem crítico, das confraternizações e festas de fim de ano. Nós não podemos banalizar a pandemia. Ninguém está seguro até que todos estejam seguros, isto é fato.
A pandemia da Covid-19 vem mostrando a importância e a necessidade de uma maior aproximação entre a ciência e as decisões de políticas públicas com forte impacto na sociedade. Neste momento, é fundamental combater a desinformação, as fake News e promover a tomada de decisão em favor de políticas públicas baseadas em evidências científicas sólidas. Só assim teremos cidadãos conscientes, bem informados, suportando as tomadas de decisões.
A OMS diz que a situação da pandemia no Brasil é muito, muito preocupante e pede que o País leve a Covid-19 a sério. Talvez seja o momento de considerar o fechamento de praias e cancelamento de eventos e festas de fim de ano.
Imunidade contra a covid-19 pode ser mais longa do que se esperava
Duas publicações recentes sugerem que a imunidade contra o Sars-CoV-2, após recuperação da doença, pode ser mais longa que o esperado inicialmente. Um dos artigos foi publicado na revista Nature no dia 12/11/2020 e mostra que pessoas recuperadas de Covid-19 apresentam células de memória de defesa (células T) que permanecem no organismo, podendo produzir uma resposta de proteção rápida em caso de reinfecção.
O segundo artigo, publicado no dia 16/11/2020 na plataforma bioRxiv, sugere que a imunidade contra a Covid-19 pode durar pelo menos oito meses após a infecção pelo Sars-CoV-2 e que a taxa de declínio lenta observada pode indicar que as células de defesa podem permanecer no organismo por alguns anos. A pesquisa foi realizada com 185 homens e mulheres como voluntários, com idades entre 19 e 81 anos, todos recuperados de sintomas leves da Covid-19.
No entanto, parece aumentar consideravelmente o número de casos de pessoas que voltaram a ficar doentes, testando positivo para a Covid-19, mesmo alguns meses após se considerarem curadas e terem negativado nos testes. Não está claro se são casos de reinfecção ou de persistência do vírus no organismo, quando a pessoa na verdade não ficou livre do vírus, mas são fatores que podem estar contribuindo para o aumento no número de infectados. Isso pode trazer problemas para quem se recuperou da Covid-19, pensou estar imune e livre da doença e pode trazer desafios para a vacinação.
Caso sejam casos de reinfecção, não seria uma surpresa, pois outros coronavírus que causam resfriado comum, também levam a casos de reinfecção. Mas o fato é que as pessoas estão aglomerando, relaxando nas medidas não farmacológicas de combate a pandemia, como isolamento social, distanciamento físico, uso de máscaras e nos hábitos de higiene. Pode ser que o aumento observado no número de casos esteja relacionado com o prazo estimado para que os anticorpos neutralizantes, que neutralizam o vírus e nos protegem da infecção, desapareçam. É necessário realizar o sequenciamento das amostras para ver se é realmente reinfecção ou persistência.
Imunidade mesmo só com vacina, que nós esperamos que possa oferecer uma imunidade mais potente do que a produzida pela infecção natural. Parece cada vez mais evidente que as vacinas precisam se mostrar muito mais potentes em estimular o sistema imunológico e ter um efeito bem mais duradouro que os anticorpos de pessoas que se recuperam da doença, nem que tenhamos que usar um número maior de doses.
por Luiz Carlos Dias, Professor Titular do Instituto de Química da Unicamp, membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico e membro da Força-Tarefa da UNICAMP no combate à Covid-19 | Texto em português do Brasil
Exclusivo Editorial PV / Tornado
Publicado no Jornal da Unicamp
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