Pois bem, com parte importante dos filmes dos Óscares no menu (mas não apenas) podemos preparar-lhe um programa à sua medida. Até porque, para a semana chegam às salas o avassalador O Renascido (com as suas 12 nomeações aos Óscares) e ainda a animação realista Anomalisa (nomeado para Melhor Animação), uma pequena obra-prima. Recupere e actualize o que lhe falta ver.
As nossas escolhas
Brooklyn
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Nomeações Óscar:
Melhor Filme
Actriz (Saoirse Ronan)
Argumento Adaptado
Numa semana em que o cinema se globaliza (valham-nos durante o ano estas semaninhas até aos Óscares!), o magnífico Brooklyn já não corre o risco de passar despercebido, pois está nomeado para o Óscar de Melhor Filme. E bem merece esta pequena preciosidade do jovem realizador John Crawley baseada no romance homónimo de Colm Tóibín, embora com o tratamento precioso de Nick Hornby (justamente nomeada a sua adaptação), sobre a vaga de emigração irlandesa, nos anos 50, para os Estados Unidos.
O filme vale tudo quanto pesa em grande parte pela prestação luminosa de Saoirse Ronan, justamente nomeada ao Óscar de Melhor Actriz, aos 21 anos, repetindo um feito conseguido aos 13 anos, quando fora nomeada à categoria secundária, por Expiação. No entanto, este é o filme que a fará disparar para outros voos, mais do que merecidos, como a Ellis forçada a abandonar a família e a sociedade algo acanhada local e juntar-se à comunidade irlandesa em Brooklyn. É aí que conhecerá o prazer da liberdade, mas também o romance com um jovem italo-americano (Emory Cohen).
No entanto, o perigo do filme correr por uma certa linearidade narrativa acaba por perder-se na segunda parte, em que Ellie regressa à Irlanda, apesar de ter casado secretamente. Só que Ellie já era também uma rapariga diferente, mais sofisticada e também mais desejável, acabando por se ver dividida entre dois países, mas também dois amores, procurando resistir ao interesse de Jim (Domhnall Gleason, como sempre espantoso, aqui num papel pré-Star Wars).
O tom clássico do filme confere a Brooklyn uma espessura inegável, mas é mesmo na presença de Saoirse que definitivamente nos rendemos, ela que estará muito provavelmente predestinada a ser uma das maiores da sua geração. Sim, uma das performances do ano (a par de Charlotte Rampling), num filme que anda perto da obra-prima.
A Queda de Wall Street
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Nomeações Óscar:
Melhor Filme
Actor (Christian Bale)
Realização (Adam McKay)
Argumento Adaptado
Montagem
Christian Bale, Steve Carell, Ryan Gossling e Brad Pitt revisitam os antecedentes imediatos da mega crise financeira de 2008 neste filme produzido por Pitt que aposta num tom ligeiro, se bem que pegue de caras o touro sobrealimentado de Wall Street. De resto, o filme que é assinado por Adam McKay, normalmente associado às paródias de Will Ferrel e Steve Carell (O Repórter: A Lenda de Ron Burgundy ou a sua sequela, Que se Lixem as Notícias), acabou também nomeado ao Óscar de realizador, ainda que, diga-se em abono da verdade, sem um trabalho em que esse mérito seja muito evidente.
No fundo, em A Queda de Wall Street temos mais uma visão do regabofe de quem podia brincar à vontade com o sistema financeiro, onde imperava a ideia de que toda a gente poderia comprar a casa dos seus sonhos. Mesmo que não tivesse dinheiro. Assim se criava o tal crédito podre e baratinho que esteve na origem na bolha prestes a explodir.
O filme centra-se num grupo de pessoas que se aperceberam desse risco e desejaram, cada um à sua maneira, tirar proveito da situação, arriscando dinheiro na expectativa de lhes virem a cair no colo muitos milhões de dólares. Temos então Steve Carell como um corretor desconfiado do sistema que decide auscultar aqueles que mais estavam sujeitos ao crédito bera; e que fica mais ou menos esclarecido quando uma stripper lhe confessa que tem crédito para cinco casas; temos também o médico tornado analista financeiro, interpretado por Christian Bale, que se concentrava a ouvir death metal em altos berros. O filme conta ainda com Ryan Gosssling no papel de um banqueiro que representa todos os vícios do sistema, tal como Brad Pitt investido no papel de um banqueiro retirado, mas que acaba por ajudar dois jovens que fizeram as contas e perceberam que estavam em face de um cataclismo.
É claro que Hollywood já respondeu com vários filmes em redor deste fenómeno, com Scorsese em O Lobo de Wall Street, sobre as falcatruas do corretor Jordan Belfort, bem como O Dia Antes do Fim, de J.C. Chandor, ou ainda o documental Inside Job – A Verdade da Crise. Nesse sentido, A Queda de Wall Street é apenas mais uma achega ao tema, abordando o tema de uma forma mais simplificada. Não será uma espécie de A crise de 2008 para Totós, mas falta-lhe um ponto de vista mais acutilante que traga algo de novo.
Mediterrânea
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O que leva um realizador italiano a debruçar-se sobre o tema dos refugiados de guerra africanos que chegam à costa italiana? No caso de Jonas Carpignano foi um processo que se desenvolveu ao longo das suas últimas curtas, A Chjàna e A Ciambra, entre 2012 e 2014. É, de resto, a personagem de Ayiva que se recupera para a longa, ele que fizera já antes o percurso de refugiado e se envolvera nos tumultos raciais com outros migrantes em Itália.
Mediterrânea, exibido em estreia mundial na Semana da Crítica no Festival de Cannes, amplia o tema, com a viagem de Ayiva (Koudous Seihon, apenas trabalhou com Carpignano) e do amigo Abas (Alassane Sy), do Burkina Faso, para a Argélia e daí para a Europa. No entanto, o que conta mais não é o tema dos inúmeros riscos da viagem, o contacto com os traficantes de pessoas, os ladrões, os afogamentos no Mediterrâneo, mas a tentativa de adaptação em Itália, os encontros, os desencontros, as saudades da mulher e da filha de Ayiva, mas também a inquietação de Abas.
Da turbulência das cenas iniciais, sempre com uma câmara à mão de Wyatt Garfield demasiado perto da acção a um enquadramento mais distante, mas sempre paredes meias entre o realismo documental e a ficção, assim se cria um micro-cosmos onde se evolui para o conflito gerado por racismo e violência, e que acaba também por dividir os destinos dos dois amigos. Uma curiosidade, a presença discreta de Benh Zeitling, o realizador de Bestas do Sul Selvagem, na banda sonora, bem como a presença de Chris Columbus, na qualidade de produtor, através da sua produtora dedicada ao cinema independente. O filme que já ganhou diversos prémios e distinções, como a escolha de finalista ao Prémio Lux 2015, um prémio de cinema do Parlamento Europeu, é distribuído pela Festa do Cinema Italiano: 8 ½.
Nota: A nossa opinião (de * a *****)