A ascensão do regime político sem nome, com seu obscurantismo e vulgaridade, combinada com demandas pessoais, tirou-me a vontade de escrever e comentar as patifarias do dia-a-dia da política.
As revelações do Intercept Brasil sobre as maquinações Moro-Dallagnol acendem alguma esperança de que a verdade, como disse Francisco a Lula, prevaleça sobre a mentira.
Aqueles diálogos e conluios não surpreendem.
Não, pelo menos, aos que tiveram clareza, desde o início, sobre os propósitos políticos da Lava Jato, aos que não fecharam os olhos para as ilegalidades, os abusos, as gambiarras e toda as maquinações urdidas para se chegar ao objetivo primordial, o de dar cabo do ciclo de governos petistas e garantir o triunfo do conservantismo, ainda que se valendo da figura primitiva de Bolsonaro, que devia envergonhar as elites nativas que lhe abriram caminho.
Afora este, existiram outros dois grupos de brasileiros.
O dos que sabiam das lavajatices praticadas mas as aplaudia por antipetismo, e o dos que acreditaram sinceramente em Moro e seus procuradores como salvadores da pátria e cruzados da corrupção.
Aos que sempre enxergaram a natureza política da Lava Jato, e por criticá-la foram chamados de coniventes com a corrupção e vassalos do PT, perderam amigos e até empregos, as revelações do conluio não surpreendem.
Trazem a náusea que vem diante da podridão, mas trazem também ar e luz, reavivam a crença na verdade e no jornalismo.
Jornalismo alternativo, por sinal, capitaneado por um jornalista estrangeiro, o que devia fazer corar a grande mídia nacional.
Tudo estava aí, à espera do empenho em conseguir as evidências de que Sergio Moro e os procuradores cruzaram a linha que deve separar quem investiga, quem instrui o processo e quem julga.
Ali, o que havia era uma organização jogando o vale tudo para alcançar objetivos políticos: primeiro, apear Dilma do poder, inclusive vazando áudios ilegalmente obtidos e divulgados, que foram decisivos para o impeachment.
Depois, forçando a mão na investigação de Lula no caso do triplex, acelerando o julgamento na primeira e na segunda instâncias, de modo a torná-lo inelegível antes do início da campanha de 2018, cassando-lhe a candidatura que seria vitoriosa.
E, ainda, cassando-lhe ao direito à livre expressão, impedindo que concesse entrevista antes do pleito, para evitar o risco de uma vitória de Haddad.
Lula sempre foi o alvo, não viu quem não quis ver e os que, por desinformação e manipulação, não têm olhos para ver.
Hoje o Conselho Nacional do Ministério Público finalmente abriu processo investigativo contra Dallagnol e os procuradores da Lava Jato. Mas falta muito mais para que seja restabelecida a crença na Justiça.
Ainda que Moro, tendo renunciado ao posto de juiz para se tornar ministro de quem ajudou a eleger, não possa mais responder ao CNJ, espera-se do STF uma reação que resgate sua autoridade como instância suprema do Judiciário.
E pode começar a fazer isso hoje, concedendo Habeas Corpus ex-Oficio ao ex-presidente Lula, condenado num processo que, agora se vê – com náusea mas não com surpresa – transgrediu o devido processo legal em mais de um ponto.
Juiz não pode trocar figurinha com procurador, juiz não pode instruir e dar pistas a investigador, juiz não pode antecipar sentença, juiz não pode dar bronca em procurador, juiz julga, não comanda todo o processo, guiando-o segundo seus propósitos.
Assim deve ser, assim manda o CPP.
O que virá agora, não se sabe.
Sozinha, a esquerda não terá força no Congresso para instalar CPI ou criar o quadro político que leve à restauração da normalidade jurídica conspurcada pela Lava Jato.
Para os partidos de centro e centro-direita que prezam o Estado Democrático de Direito estão desafiados a também reagirem exigindo o mínimo, para começar: afastamento de Moro do MJ e dos procuradores da Lava Jato, libertação de Lula e revisão dos processos decorrentes da operação.
Isso não quer dizer perdão aos corruptos de fato mas garantia de justiça nas condenações, pois agora sobre tudo paira a sombra.
Texto em português do Brasil
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