O mundo gravita entre dois polos. Entre o materialismo e a espiritualidade. Entre a economia e a religião. Entre o petróleo e a verdade da Fé – da crença.
Recentemente, a SIC transmitiu uma reportagem sobre as religiões e de como estas serão daqui a 15 anos. As opiniões divergem, mas não muito!
O que sabemos é que o vencedor tem o direito a contar a história à sua maneira, sendo essa a versão que passará de boca em boca e de livro em livro. Muitos preocupam-se com a nova vaga de muçulmanos, outros defendem os processos de aculturação.
O Comissariado português para esta vaga de refugiados tem conduzido o processo à luz do ecumenismo, correndo o risco de fazer confundir o apoio aos refugiados de guerra, com a solidariedade própria das IPSS, muitas delas ligadas às religiões. – Uma coisa, é uma coisa. Outra coisa, é outra coisa!
Acredito nos processos de aculturação. Portugal tem história e dá cartas nessa matéria. Neste canto da Península foi possível que várias religiões coabitassem ao mesmo tempo. Ainda hoje vigora em Portugal o Rito Moçárabe.
Durante o período de ocupação árabe coexistiam nas mesmas cidades, um pouco por todo o país: os bairros cristãos, os bairros islâmicos, os bairros judeus e os bairros moçárabes. Em certa medida a criação da Alheira é, não só, fruto da necessidade de sobrevivência, mas principalmente, o resultado eficaz de um processo de aculturação.
Colocam-se algumas perguntas:
– Seremos hoje capazes de reconstruir um processo ecuménico e de aculturação entre várias verdades religiosas?!
– Seremos capazes de tamanha tolerância quando os cenários de guerra – muitas vezes guerrilhas económicas e petrolíferas encapotadas de guerras religiosas – entram pelas nossas casas adentro – sem pedir licença – em horário nobre e à hora em que as famílias jantam – quase sempre com a televisão ligada no telejornal para que estas estejam mais ocupadas a ver noticias em vez de falarem uns com os outros?!
– É o afastamento dos jovens das religiões um facto facilitador dos processos de aculturação e propício a um maior grau de tolerância entre as pessoas?!
Paradoxalmente, ao mesmo tempo que as pessoas se afastam das religiões de massas, procuram preencher o vazio da espiritualidade encontrando Deus cada um à sua maneira. Uns criam seitas, outros encontram no Yoga uma nova forma de viver, outros buscam os rituais mais ancestrais da história e que estão na origem de muitas festas religiosas um pouco por todo o mundo. Outros buscam a verdade na natureza, outros na ciência e outros ainda na filosofia.
Pessoalmente, creio que estas verdades se interligam e todas – ou quase todas – estarão imbuídas de bondade e Amor.
Há um lado interessante e pouco abordado ao nível das religiões. Todas as grandes religiões de massas têm dentro de si aspectos de estudo que levaram à coexistência de escolas espirituais internas quase sempre negadas e perseguidas pelas próprias religiões que lhe deram origem, porquanto ao desfazerem a simbologia e a mística própria de casa religião, põem a nu a fragilidade dos dogmas em que estão assentes.
É esse estudo interno sobre a verdade e origem de cada Fé que faz com que a gnose Sufi (do islão), a gnose Cabalista (judaica), a gnose Rosacruz (do cristianismo primitivo) – não confundir com graus maçónicos – o estudo do Tao e o Zen-Budismo, e até mesmo alguns graus superiores da Maçonaria Temporal, digam a mesma coisa por palavras diferentes e que estas sejam a cada dia corroborada pelos avanços da ciência, nomeadamente pela física quântica: Que a unidade encerrando tudo em si, é composta por diversidade. Que cada célula de vida é um microcosmos igual ao cosmos gigante que nos rodeia. Que pelo principio de que nada se cria, nada se perde e tudo se transforma, é possível mudar tudo, mas que para mudar o mundo exterior é preciso que cada homem e mulher se transforme a si mesmo por dentro, onde “o essencial é invisível aos olhos” – como dizia Exupéry.
Ficando a meditar nas minhas próprias palavras pergunto-me: – E se Deus realmente escreve direito por linhas tortas, não se poderá dar o caso estarmos a caminhar para mundo onde cada pessoa imbuída de um auto-conhecimento superior seja capaz de grandes obras?! Não será possível transformar a Guerra em Paz, onde o chumbo que cada um carrega dentro de si seja transmutado em Áurea luz?
O mundo gira entre antagonismos e muitas vezes a guerra pelo controlo do território serve-se da religião para atingir os seus fins, porquanto a religião – a capacidade inata que todos temos de nos religar a Deus, aos Homens e ao mais intimo de nós mesmos – é, ao mesmo tempo, a nossa maior fragilidade e a nossa maior força.
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